• Criança é seda

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  • 11/11/2017 12:00

    Criança é milagre. Nela vemos, em maior escala, o ocorrido no ínfimo, quando a união de células, o ovo em que dorme a pessoa viva, e que aos poucos virou um girino na barriga da mãe, um dia se transforma em feto, até no parto eclodir: pessoa nascida e berrante. Na criança, a gente vê a rapidez das metamorfoses. Choro na madrugada, gargalhada da inocência sem dentes, avidez que devora mamadeiras, encanto com o papel do embrulho mais do que com o presente, andar bêbado de quem sai a existir pela sala, o balbucio de palavras criadas, arremedadas, remendadas, vocábulos que serão fala. Privilégio assistir a essas transformações velozes! 

     Só conhece a infância da criança em seu ninho, quem com ela criança se faz. Rolar pelo chão, ser montaria, pintar seu rosto com o mesmo amarelo com que a criança te tatua a bochecha. Magia ler para a criança, sendo cinema e teatro que a fará rir, a assustará um cadinho, a deixará um pouco em suspense, e a fará vibrar com vitórias do bem. Mesmo que a criança se atraia pelo monstro ou a bruxa que a aflige, ela torce pelo bem, quer a paz, amor que vença e convença.

    Marcas seremos na vida de uma criança. Mas podemos ser nada. Ou uma chaga. Cabe a cada um com o privilégio de uma criança: pais, tios, professores, avós, babás – cabe a cada um escolher como será lembrado. Se jamais tocar o papel de seda, nele você não existirá. Mas pode suavemente riscar o papel de seda com marca d'água de carinho e afeto. Ou pode ser o rinoceronte que devasta a seda com dureza e desleixo. Criança é seda, asa de borboleta, pétala de veludo. Delicadeza com elas!

    Quem conhece meu trabalho, sabe que prezo o ensino de limites, a disciplina familiar em tempos frouxos de crianças com pais relapsos, que se ausentam da missão e criam filhos que serão gente gosma, gelatinosos, sem consistência ou capacidade de existir, eis que viver é resistir. Mas disciplina não afasta a gentileza no trato. Pais que entendem mal a disciplina fazem lares-quartéis. Sem aconchego ou abraço. Sem cântico ou beijo. Não podemos passar a mão na cabeça da criança todo o tempo, mas urge lhe dar colo o tempo todo. Não é uma contradição! Disciplina eficaz se faz com amor verdadeiro. Quem rolou com a criança no chão, melhor resultado achará quando exigir comportamentos corretos.

    Quem só chicoteia, jamais afaga, será carrasco somente. Corre o risco de ver suas “preciosas” lições esquecidas. As “boas intenções” com que desculpa seu rigor, só ajudarão a encher o inferno já abarrotado. Discipline, mas antes seja afetuoso. Jesus veio criança. A Bíblia refere os pais terrenos, dizendo que Cristo “era-lhes sujeito”. Ou seja, submisso e obediente. Mas não imagino Maria, sua mãe terrena, tratando Jesus com aridez, cara dura, palavra ríspida, falta de afeto. Da mãe, Jesus teve colo, beijo, abraço, brincadeira na lama; de José, ser atirado ao ar para pousar em seus braços, corridas pelos montes, carrinhos da carpintaria. E era-lhes sujeito. Deus não ia entregar seu Filho a pais que não entendessem e amassem o milagre da infância. 

    Respeite o milagre. Atenue cobranças, rispidez, frieza e fala dura. Abrace e brinque mais, respeite melhor a crisálida que um dia será gente completa. Só assim lembrará você como jardineiro querido, cuidador amoroso, disciplinador gentil, e não o carrasco insensível, o algoz frio. Não seja só um trauma a ser vencido pelo resto da vida. Seja lã, faça luz, torne-se porto seguro.

    denilsoncdearaujo.blogspot.com

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