• A vírgula nas delações

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  • 27/06/2016 12:00

    A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) completou 100 anos em 2008. Na época, lançou uma campanha publicitária bem sugestiva, destacando a sutileza na mudança do sentido de frases com a colocação da vírgula. O anúncio publicitário terminava com a seguinte afirmativa: "Uma vírgula muda tudo. ABI: 100 anos lutando para que ninguém mude uma vírgula da sua informação". Eis o texto:

    “A Vírgula pode ser uma pausa… ou não. / Não, espere. / Não espere…

    Ela pode sumir com seu dinheiro. / 23,4. / 2,34.

    Pode ser autoritária. Aceito, obrigado. / Aceito obrigado.

    A vírgula pode criar heróis. / Isso só, ele resolve. / Isso só ele resolve. 

    E vilões. Esse, juiz, é corrupto. / Esse juiz é corrupto. 

    Ela pode ser a solução. / Vamos perder, nada foi resolvido. / Vamos perder nada, foi resolvido.

    A vírgula muda uma opinião. / Não queremos saber. / Não, queremos saber”.

    A imprensa e a Polícia Federal, no momento, vêm exercendo um papel importante para a sociedade. Estão revelando fatos que ocorriam nos bastidores da política brasileira. 

    A verdade é imprescindível na formação de opiniões. Portanto, as vírgulas devem ser empregadas corretamente para que não haja deturpações. Ninguém pode ser condenado injustamente. É preciso também estar atento para não haver manipulação das informações a fim de beneficiar culpados. Por isso, é necessário ter cuidado até com a colocação das vírgulas. Veja as seguintes frases: “O Conselho de Ética condenou, eu não absolvo”. / “O Conselho de Ética condenou eu não, absolvo”.

    Nessas delações, até as vírgulas devem ser colocadas nos lugares certos para que não se transformem em calúnias. Como também tais delações não podem ser cortinas de fuma, nem podem ser os bois dados às piranhas para permitir a passagem do resto da manada. 

    O momento é muito delicado. Falo da vírgula para evidenciar o cuidado que devemos ter com a língua e com a linguagem. É preciso ficar atento diante da pontuação tendenciosa. Cito outro exemplo bem conhecido. Você já deve ter ouvido a seguinte frase:

    “Se o homem soubesse o valor que tem a mulher andaria de quatro a sua procura.” 

    Se a leitura for feita por uma mulher, certamente colocará a vírgula depois do substantivo “mulher”. Se for feita por um homem machista, provavelmente colocará a vírgula depois do verbo “tem”.

    A vírgula pode até matar. Veja as frases: “Não mata”. / “Não, mata.”/ Ou condenar ou salvar: “Não tenha clemência! / “Não, tenha clemência!”.

    É do conhecimento de todos que as revistas semanais, os jornais buscam matérias “exclusivas”, vibram quando fazem um “furo de reportagem”, quando chegam antes da polícia. É importantíssimo esse trabalho da imprensa, de expor a verdade para a sociedade. Há o mérito de quem informa “em primeira mão”. Muitos repórteres colocam a vida em risco para levar a informação à opinião pública.

    A expressão “vazamento seletivo” tem sido muito usada, quando algum trecho das delações chega ao conhecimento da população. O que se colocava para a sociedade ainda é muito pouco, porque muitos processos correm em segredo de justiça e muitos investigados têm fórum privilegiado. Mas o pouco que se ouve e que se lê revelam a forma como o bem público era tratado. E pergunta-se:

    – Como ficará o Brasil depois de todas as investigações? 

    Espero que, pelo menos, fique claro para a população que o crime não compensa, que a dignidade não tem preço e que a ética não tem partido político. E para quem acredita em Deus, que não vale ganhar o mundo e perder a alma.


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