• Rony supera árduo caminho, agarra chances e se torna destaque do Palmeiras

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 07/02/2021 07:05
    Por Ciro Campos / Estadão

    Ronielson da Silva Barbosa passou fome na infância no interior do Pará, precisou trabalhar de mototaxista para se sustentar, quase foi atingido por um rojão e levou anos até desenvolver a habilidade do chute a gol. Por isso, a pressão de hoje vestir a camisa 11 do Palmeiras e ser conhecido como Rony não assusta. A responsabilidade de estrear no Mundial de Clubes contra o Tigres, do México, é na verdade um prêmio para quem até quase desistiu do futebol.

    O atacante de 25 anos desembarcou em Doha nesta semana com traje chique. O terno e a gravata preparados pelo Palmeiras para vestir a delegação nem parecem a roupa utilizada até pouco tempo pelas ruas de Belém. “O Rony várias vezes chegava treinar no Remo com o uniforme amarelo dos mototaxistas. Ele fazia esse trabalho para completar a renda. Só com o futebol não dava para viver!”, contou ao Estadão o diretor de futebol do Remo, Paulo Araújo.

    Até se dedicar exclusivamente ao futebol, Rony também trabalhou de mecânico e contou com um acaso. O Remo dispensou o atacante no início de 2014, mas voltou atrás porque herdou uma vaga para a disputa da Copa São Paulo com a desistência da Tuna Luso. O clube precisou montar o time às pressas. Aos 18 anos, Rony estava desiludido, voltara para a cidade natal (Magalhães Barata) e quase não acreditou que teria outra chance. Na competição, ele ainda fez um gol contra o Corinthians.

    Naquela época, o Remo enfrentava uma crise financeira e técnica. A equipe não tinha jogadores para montar o banco de reservas para enfrentar o São Francisco, pelo Estadual, e o então treinador interino Agnaldo de Jesus decidiu chamar Rony.

    O menino, bastante magro e tímido, chamou a atenção do presidente do clube, Zeca Pirão. Na concentração, o dirigente prometeu que pagaria ao atleta R$ 1 mil se ele entrasse e fizesse um gol. Teve de cumprir.

    “Rony sempre teve muita velocidade, mas no começo da carreira ele corria com a bola de cabeça baixa, sem olhar para os lados. Ele tinha também uma certa dificuldade para bater na bola”, contou Agnaldo, conhecido como Seu Boneco. “Rony é um garoto esforçado e humilde. Gosta de ouvir os outros e sempre gostou de comemorar gol dando essas cambalhotas.”

    A passagem pelo Remo ficou marcada por dois títulos estaduais e por um susto. Uma torcida organizada invadiu o treino da equipe para protestar. O estouro de um dos rojões quase acertou Rony. Abalado, ele chegou a receber atendimento médico. Anos depois, Rony usou o dinheiro ganho em uma ação na Justiça contra o clube para construir uma casa para a mãe.

    O atacante passou pela base do Cruzeiro e em 2016 chegou ao Náutico, onde teria um professor especial. O ex-atacante Kuki já trabalhava de auxiliar e ficou intrigado ao ver aquele jovem de 21 anos. “Faltava ao Rony saber aliar a velocidade à melhora na finalização”, contou Kuki. Rony aceitou ficar um pouco a mais nos treinos só para praticar chutes a gol.

    Kuki passou ao atacante detalhes sobre o posicionamento do corpo e do pé de apoio, além de truques para tirar a bola do goleiro. Deu certo. Rony foi o vice-artilheiro da Série B com 11 gols. “O mérito dessa evolução em como bater na bola foi totalmente dele”, contou Kuki.

    As dificuldades também marcaram a passagem dele pelo Albirex Niigata, do Japão. Rony quase quis voltar quando o forte inverno começou. A alimentação era um grande problema. O jogador não gostava das opções e passava o dia comendo bananas. Em 2018, o Athletico-PR o resgatou. Rony foi campeão da Sul-Americana e da Copa do Brasil. Em 2020, o Palmeiras pagou R$ 28 milhões por ele.

    Muito religioso, Rony gosta de participar de ações da igreja e, quando morou em Curitiba, frequentemente saía às ruas para doar comida e cobertores para pessoas em situação de rua. O novo hobby dele é tocar bateria. O instrumento foi um presente de Natal dado pelo empresário Hércules Junior, chamado carinhosamente de pai pelo jogador. O atacante tem pouco contato com o pai biológico, que se separou da sua mãe.

    A adaptação ao Palmeiras foi difícil. Rony levou nove meses até marcar o primeiro gol. Depois disso, disparou. O passe para o gol do título da Libertadores saiu dos pés dele e foi uma de suas oito assistências na competição. A vida do camisa 11 mudou muito rápido. Agora, tem ótimo padrão de vida, não precisa mais do mototáxi para se sustentar e só se aproxima dos rojões se for para comemorar títulos.

    Últimas