• Sabedoria popular

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  • 18/11/2020 11:22

     

    Hoje achei oportuno colocar em discussão a imagem que fazem da inteligência do povo. Muitos, principalmente em período eleitoral, subestimam o poder de análise da sociedade e fazem promessas absurdas, ignoram a capacidade da população de estabelecer um raciocínio lógico. Já não se engana mais índio com espelho. Já não se manipula, com facilidade, a opinião pública.

    Hoje o acesso à informação está mais fácil. E a partir dela, os comentários podem ser na fila do ônibus, no cafezinho na padaria, no táxi, na praça, em suma, não se discute somente o futebol e o último capítulo da novela; o dia a dia também entra na pauta.

    Não se fala somente das variações do clima no elevador, há tempo para falar da falta de água, de luz, do trânsito caótico, da alta de preço nos supermercados. Até o tempo perdido em fila de espera é capaz de induzir à reflexão. Cresce o número de pessoas que trilham o caminho da justiça em busca de seus direitos.

    Ouço constantemente que a corrupção se tornou um ato cultural, porque é comum o cafezinho, a caixinha, a cervejinha, a gorjeta, o por fora, o caixa dois, o molhar a mão, o jabá, a propina, o cala boca, o sem nota, o sem recibo, o não declarado, em síntese, o mecanismo de suborno, o tráfico de influência estão inseridos no cotidiano da sociedade. Mas isso não quer dizer que há uma assimilação de tais práticas sem questionamento.

    A “honra não tem preço” (honor non habet pretium). São inúmeras as ações por “danos morais”, as pessoas querem uma reparação financeira quando são lesadas moralmente. A defesa da dignidade é um exercício de cidadania. O estágio de esclarecimento da população já permite procurar as defensorias públicas até mesmo para garantir um atendimento digno na área da saúde.

    Já se constatam algumas mudanças no comportamento da população, já não se pode dizer assim com tanta veemência “tal rei, tal povo” (quales principes, tales populi). Pelo voto, de forma democrática, a sociedade aprendeu a dizer não. Quem hoje pensa que o povo é “uma vaca de presépio” engana-se.

    Hoje já não bastam pão e circo (panem et circenses), a população começa a questionar o comportamento dos governantes. A postura ética, a idoneidade moral, a ficha e as mãos limpas passaram a influenciar no processo eleitoral. Ainda temos muito que mudar, mas os primeiros passos estão sendo dados. A velocidade das mudanças passa pelo sistema educacional. Mas é preciso ressaltar que essa educação não se limita ao âmbito escolar, a família tem papel importante na fundamentação de valores que possam consolidar o respeito mútuo.

    Hoje há uma carência de pessoas que possam servir de padrão de conduta. Nota-se uma necessidade da multiplicação de exemplos de vida, que sirvam de modelo, de incentivo para os jovens. O “faça o que eu digo, mas não faça o que faço” agora só serve como exemplo de incoerência. Os ônus das contradições são pesados, porque podem evidenciar desvios de personalidade. A frase maquiavélica que diz que “quem não sabe dissimular não sabe reinar” (qui nescit dissimulares nescit regnare) começa a ruir, porque “alguém pode enganar poucos por muito tempo, muitos por pouco tempo, mas não todos por todo tempo”.

    Quando alguém escolhe seguir uma carreira pública deve ter consciência de que a postura tanto na vida profissional, quanto pessoal, estará em evidência. Muitos encontram dificuldades para separar o público do privado, gerando conflitos de natureza psicológica. Nem todos suportam a invasão de privacidade, principalmente quem vive mergulhado nas incoerências. Nesse ponto, a língua do povo é cruel, picha mesmo. A visão maniqueísta prevalece, coloca, de um lado, os heróis; de outro, os bandidos. E estes, dependendo crime, despertam o instinto do linchamento, seja físico ou moral.

    O povo tem a emoção à flor da pele, o que favorece ao fanatismo. Esse fato é que o deixa vulnerável. E é por esse caminho que muitos tentam manipulá-lo. Mas quando ele constata que foi enganado, reage de forma imperdoável, por isso que as manifestações de repúdio são agressivas. E dependendo da indignação, vai às ruas em massa, até em protestos desordenados. Engana-se quem pensa que o povo tem memória curta, “boi deitado não é vaca”.

     

     

     

     

     

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