Stop Light: a loja de parar o trânsito
Ainda que aconselhados a parar, os clientes da Stop Light desconsideravam o alerta e avançavam. Guiados pelos letreiros que ditavam o percurso, livravam-se dos obstáculos que pudessem prejudicar o fluxo; recorriam ao crediário e às remarcações; abriam caminho para a marca que, ‘bem transada’, foi registrada no vestuário e no pensamento.
Arquivo Biblioteca Municipal
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A ideia de abrir uma loja já existia, mas foi diante de um semáforo, no Rio, que ‘La Roque’, então companheiro de Edilce La Roque, de 72 anos, batizou o empreendimento. Com os olhos fixos no sinal vermelho, ele avançou no tempo e viu, em ‘stop light’, o nome ideal para identificar o negócio de parar o trânsito que estava prestes a fundar.
Descolado e completo como poucos outros, o estabelecimento fazia todos os gostos. Na venda de calçados, peças de vestuário, trajes de festa ou banho, o local mantinha satisfeitos os públicos masculino e feminino – a começar pelos sócios. Professora, Edilce conta que deixou as salas de aula para dar o sinal verde à fundação do negócio.
Primeiro contato tido com o comércio, foi na Stop Light que Edilce viu os papéis a que estava costumada se inverterem e, de professora, se tornar aprendiz. Também na classe estavam o gerente Nilson e a vendedora ngela, cujo atendimento, segundo ela, “era de alto padrão”.
“Nunca vi coisa igual. A ngela nunca me largou e chegou, inclusive, a trabalhar comigo na filial do Leblon. Fomos juntas, nos trancos e barrancos”. Uma das primeiras – senão a primeira – mulher negra a atuar no comércio petropolitano, ngela deixou como legado, sobretudo, a unanimidade sobre a profissional exemplar, simpática e elegante que foi.
Com Ângela também atuou a última gerente da loja em Petrópolis, a petropolitana Elaine de Moura Ventura, de 64 anos. Ex-colaboradora do empreendimento, ela torna seguro dizer que se para os clientes a Stop Light se tornou praticamente palavra de ordem para avançar em direção às mercadorias, para os funcionários a denominação foi sinal de liberdade.
Liberdade para abordar, se aproximar e conquistar os clientes; para na loja chegar e, se fosse da vontade do funcionário, nela crescer como fez Elaine. Contratada como vendedora, de lá ela saiu depois de 16 anos realizada como gerente e, principalmente, como alguém que descobriu, na venda, uma vocação.
“Sempre digo que foi um dos melhores tempos da minha vida. Em todo lugar que vou, tem sempre alguém que me reconhece de lá”. Do atendimento a celebridades como a atriz Christiane Torloni às liquidações em que até seguranças precisavam fazer guarda na porta, Elaine contribuiu com a consolidação da marca ao mesmo tempo em que fez dela a sua.
Fluxo intenso a todo tempo
Dispostos a se livrar de quaisquer que fossem os obstáculos que colocassem em risco o caminho para a Stop Light, os clientes davam sempre um jeitinho de manter o fluxo do percurso. Via crediário – ou fora dele; liquidação – ou não, o movimento acontecia na mesma velocidade com que chegavam as novidades que chamavam a atenção da garotada.
Atenta, era com os olhos vidrados na vitrine que a jovem estudante Liane Bauer Castor Diehl passava em frente à loja. E como que na cena do semáforo em que o nome do negócio foi concebido, Liane se viu parada diante do mesmo sinal que ‘La Roque’, sinal que a fez avançar para o dia em que teria seu sonhado “cinto vermelho de bombeiro”.
Aos 56 anos, a agora psicóloga relembra com a mesma alegria da época a sensação de descobrir que seu irmão – sabendo de seu maravilhamento pelo item – havia usado um de seus primeiros salários na compra do acessório para o aniversário de Liane. “Usei o cinto até o couro rachar. Era de lona vermelha, lindo! Super estiloso na época”.
Incapazes de controlar o que acontecia na Stop Light, ficava acertado que o que acontecia nela, bom… Dela saía! De conversas com manequins à aparelhagem de som do William – o Papel, é fato que ex-funcionárias mantém grupos ativos para relembrar aquele tempo. Inédito para elas, contudo, deve ser o episódio do fusquinha do ‘seu’ Santo Facchetti.
Sobrinha de Santo, Rafaela Facchetti, de 62 anos, o elege como um dos mais marcantes de sua infância e juventude. Até porque foi naquela enchente da década de 70 que o veículo de seu tio – então morador do Edifício Federal – foi carregado pela correnteza e levado para dentro da Spot Light.
“Aquilo me marcou de tal maneira que me tornei engenheira sanitarista. Tenho tanta fixação no assunto que até minha tese de doutorado fiz sobre as enchentes de Petrópolis”. Capaz de parar – ou o trânsito virar de ponta cabeça – foi a Stop Light marca registrada no vestuário e comprovada no pensamento de quem por ela, inevitavelmente, se fixou.
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