A declaração da Prefeitura de Petrópolis de “falência orçamentária” em duas petições judiciais repercutiu entre os vereadores. A fala veio para justificar o caos vivido nesta primeira quinzena de novembro, com atraso de salários e até mesmo falta de merenda escolar. Para Fred Procópio (MDB), Gilda Beatriz (PP) e Júlia Casamasso (PSOL), faltou diálogo e transparência do governo municipal, além de criticarem também o aumento de despesas e a ausência de um plano de contingência para lidar com a situação.
Um dos agravantes da situação de “falência”, segundo a Prefeitura, é uma dívida de cerca de R$ 266 milhões de precatórios. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) apontou que o município deveria ter pago parcelas mensais de R$ 7 milhões, mas, como o governo não cumpriu o compromisso, o TJRJ determinou o bloqueio de repasses do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
“Essa declaração de que o precatório causou o problema é uma mentira. Já havia uma previsão de pagamento dele. Quando não pagam, aí é o problema, o Tribunal vem e arresta o recurso. Foi o que aconteceu”, opinou Fred Procópio.
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As vereadoras também apontam que não houve nenhum diálogo com a Casa Legislativa, em específico, sobre esta questão dos precatórios.
“Este é mais um exemplo da falta de planejamento do Executivo. Na LOA de 2024, foram previstos cerca de R$ 70 milhões para precatórios, mas até agora foram pagos apenas R$ 18 milhões, sem nenhum diálogo com a Câmara. Faltou, novamente, planejamento do executivo municipal no empenho e gasto do orçamento público municipal e é grave a consequência sobre o bloqueio de verbas”, disse Júlia.
Faltou planejamento
O problema se soma ao imbróglio em relação à queda do Índice de Participação do Município (IPM), que define o quanto a cidade recebe de repasses estaduais, como o ICMS. Em 2022, uma liminar aumentou o IPM de Petrópolis com mudanças na Declan da GE Celma, mas isso gerou alta nas despesas e reduziu a fatia de outros municípios, o que levou Teresópolis a contestar no TJRJ, que derrubou a liminar. Após idas e vindas, incluindo decisão do STF, foi determinado o escalonamento da redução do IPM e a devolução dos valores extras recebidos no período de transição até 2028. Mesmo ciente da queda, o governo não anunciou um plano de contingência.
Fred Procópio aponta que, em março, já havia alertado sobre o problema, mas a equipe da Secretaria de Fazenda não apresentou um plano de contingência, apesar de reconhecer a dificuldade.
“Essa realidade poderia ter sido evitada, se tivesse deixado de lado o ano eleitoral e cuidado da cidade. A gente precisava ter cortado despesa lá atrás, com base na radiografia que tínhamos naquele momento. Se viesse uma decisão favorável que aumentasse com o ICMS, ok, o dinheiro chegou e teria como voltar com atividades que teriam que cortar. Mas não, ficaram contando que haveria uma vitória, que não chegou, e agora temos que lidar com uma derrota maior”, afirmou.
Vereadores reclamam de falta de transparência
Vereadores também questionam a falta de transparência sobre o tema. A Prefeitura chegou a ingressar na Justiça contra duas leis de Fred Procópio que previam a apresentação dos relatórios quadrimestrais da Defesa Civil e Educação.
“A transparência do governo em relação a estes problemas foi totalmente obscura, afinal, não seria em ano eleitoral que essa bomba explodiria antes das eleições, não é?”, opinou Gilda Beatriz.
Júlia Casamasso lembra que integrantes do governo, incluindo o próprio prefeito, faltaram a convocações e convites da Câmara. Ao citar a “penúria financeira” alegada pelo procurador-geral do município em petição judicial, a atual gestão disse que seria apenas “jargão jurídico”.
“Desde o início, o Legislativo tem sugerido alternativas e tentando colaborar para superar essa situação, mas as respostas do Executivo se limitam em atribuir a crise ao ICMS. Além disso, a publicação atrasada do Diário Oficial prejudica o acesso à informação, situação que o TCE já determinou que fosse corrigida. Nosso papel tem sido o de fiscalizar e mediar, mas a falta de transparência torna essa missão cada vez mais desafiadora”, afirmou.
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Aumento de gastos
O aumento de gastos, contando com uma liminar, também foi criticado. Segundo Casamasso, a Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada na Câmara previa R$ 60,6 milhões para a Comdep, enquanto o governo já destinou R$ 136 milhões para a empresa de economia mista. Em relação à manutenção de praças, parques e vias públicas, o previsto era de R$ 19 milhões, mas foram empenhados R$ 52 milhões e liquidados R$ 20 mil. “As prioridades orçamentárias foram mal definidas, com decisões questionáveis em ano eleitoral, como contratos emergenciais e gastos excessivos em setores como coleta de lixo, merenda escolar, pavimentação de péssima qualidade e terceirizações, tudo sem a devida transparência”, disse.
“Com a expectativa de uma alíquota maior do ICMS, o atual governo aumentou as despesas, gastando por conta. Agora, está faltando para as necessidades principais. Só com o escritório de advocacia contratado justamente para defender a questão do ICMS, gastou-se R$ 35 milhões, situação denunciada por mim no Tribunal de Contas, onde tramita o processo”, lembrou Gilda.
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Os vereadores também se preocupam com as condições em que a máquina pública chegará até o final do ano e com o orçamento de 2025, elaborado pelo governo atual, que prevê menos recursos do que o necessário para merenda e pagamento de servidores.
“Agora é preciso conter as despesas, para que os alunos voltem a ter a merenda a que têm direito, para a regularidade do transporte escolar de pessoas com deficiência e para que serviços como coleta de lixo voltem a funcionar”, disse Gilda.
“A realidade hoje é que a Secretaria de Educação, que tem 25% do orçamento do município carimbado para ela, não consegue colocar comida na mesa das crianças na escola”, lamentou Fred Procópio.
A Prefeitura foi procurada, mas não respondeu até a última atualização.