• Impasse eleitoral na Venezuela vira dor de cabeça para governo Lula

  • Continua após o anúncio
  • Continua após o anúncio
  • 12/ago 08:08
    Por Jéssica Petrovna / Estadão

    O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender uma solução pacífica para Venezuela após a reeleição de Nicolás Maduro, denunciada pela oposição como fraude. O chavismo, no entanto, não abre espaço para uma saída negociada e resiste à pressão internacional para comprovar a sua vitória.

    O governo brasileiro cobra a divulgação das atas de votação, que até agora não foram apresentadas pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), dominado pelo chavismo. A resistência de Caracas complica a posição de Lula, que tenta liderar o diálogo com apoio dos presidentes da Colômbia, Gustavo Petro, e do México, Andrés Manuel López Obrador – todos de esquerda e próximos de Maduro.

    Alto risco

    A posição do governo de pedir por transparência e esperar as instituições venezuelanas antes de reconhecer os resultados divide analistas ouvidos pelo Estadão. Há quem defenda que a cautela está correta e há quem diga que o País deveria ser mais firme com a ditadura.

    “A posição do Itamaraty tem sido correta. Há muitos indícios de fraude, mas a posição de um País que respeita a soberania é de esperar que as provas apareçam para se posicionar”, avalia Daniel Buarque, editor da revista Interesse Nacional. Ele pondera, no entanto, que o Brasil precisa impor limites.

    Lula já disse que, apresentadas as atas, a oposição deve contestar os resultados na Justiça (também controlada pelo chavismo) e a decisão deverá ser acatada. “Essa atitude de Lula criou uma armadilha contra o próprio governo. E se as atas não forem apresentadas?”, questiona o ex-embaixador Rubens Barbosa, em artigo publicado no Estadão.

    Dúvidas

    “Está claro que Maduro não vai apresentar atas contra si mesmo, se incriminando ou dizendo que ele perdeu”, afirma Hussein Kalout, cientista político, professor de relações internacionais e ex-secretário especial de assuntos estratégicos da Presidência.

    “Ainda que apresente essas atas, elas já perderam credibilidade. Quem garante que não serão falsificadas ou fraudadas? E quem vai auditar essas atas é o próprio governo”, continua. Ele reconhece o quão delicada é a posição brasileira, mas afirma que o País deveria ter se preparado para o cenário de convulsão social e política da Venezuela.

    Desde que voltou ao Planalto, Lula demonstrou dificuldade em criticar o aliado de longa data. Na mesma entrevista em que defendeu a saída pela Justiça, ele disse que não via nada de “anormal” no processo venezuelano. O PT foi além e reconheceu a vitória de Maduro.

    “Existe essa proximidade histórica e ideológica”, afirma Buarque ao fazer paralelos com o caso da Nicarágua. “Lula e o PT têm dificuldade (em romper com antigas alianças). É uma visão de mundo antiga, desconectada da realidade.”

    Essa proximidade foi vista várias vezes desde o ano passado, quando Lula voltou à presidência. O petista tentou resgatar o chavista do isolamento internacional, que se intensificou depois das eleições de 2018, também contestadas. O Brasil participou das discussões dos acordos de Barbados, que deveriam garantir a lisura do processo deste ano, mas que têm sido desrespeitados por Maduro desde o início.

    Vetos

    De saída, o regime inabilitou a líder opositora María Corina Machado e impediu o registro da candidatura de Corina Yoris, opção inicial para substituí-la. Em resposta, os EUA reimpuseram sanções que haviam sido relaxadas e governos mais simpáticos ao chavismo, como Lula e Petro, fizeram críticas inéditas.

    A pressão se intensificou na reta final da campanha, quando Maduro ameaçou com “banho de sangue” e “guerra civil” em caso de derrota. Lula se disse assustado com a declaração e rebateu: “Maduro tem de aprender. Quando você ganha, você fica, e quando você perde, você vai embora”.

    Sem citá-lo diretamente, Maduro respondeu que quem tivesse se assustado deveria tomar um chá de camomila. No dia seguinte, ele disse, sem provas, que as urnas brasileiras não são auditadas. O ataque levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a cancelar o envio de técnicos a Caracas.

    Ainda assim, o Planalto mandou o assessor especial para assuntos internacionais, Celso Amorim, destacado para ser os “olhos e ouvidos” de Lula. A decisão foi considerada um erro por alguns analistas. “Essa missão, por mais que seja bem intencionada, não tem como avaliar a lisura”, afirma Kalout.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

    Últimas