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  • 04/ago 08:00
    Por Ataualpa A. P. Filho

    “Propriocepção” é uma palavra que comecei a usar com frequência depois que percebi a diminuição da mobilidade da minha mãe, que neste mês de agosto completará 85 anos. As dificuldades na locomoção surgem com o decorrer dos anos. Os nossos limites chegam lentamente…

    Ela sempre fala que não tem a mesma agilidade de outrora. Antes, além do grande volume das tarefas domésticas para educar oito filhos, ainda trabalhava em uma editora na qual se aposentou, ou seja, teve a carteira assinada apenas por uma única empresa.

    Às vezes, temos dificuldades para aceitar as limitações impostas pelo tempo. Reconheço que a consciência dos nossos limites não nasce assim de forma tão simples. Sinto, na pele, o descompasso entre o que a mente comanda e o corpo não obedece.

    A propriocepção, que também é chamada de cinestesia (assim mesmo, com “c”, com “s” é a figura de linguagem) está relacionada ao equilíbrio corporal, à consciência da postura que devemos ter para evitar quedas, entorses, lesões…

    Para manter o equilíbrio postural, precisamos nos exercitar para fortalecer a musculatura. As atividades aeróbicas devem ser de baixo impacto. Pilates, hidroginástica estão entre as atividades que ajudam no fortalecimento muscular.

    É comum, com o passar dos anos, a perda de sensibilidade por distúrbios neurológicos, como também a diminuição da visão, da audição. Fatores que, ao lado das doenças crônicas e dos efeitos colaterais de alguns remédios, aumentam a probabilidade das quedas. Cuidados devem ser redobrados, uma vez que as fraturas nessa faixa etária são mais preocupantes, pois as consequências tendem a ser mais graves, em razão das transformações que o nosso organismo sofre em função do próprio envelhecimento.

    As quedas são mais frequentes no ambiente doméstico. Por isso são necessárias as adaptações nos cômodos da casa para favorecer as locomoções, principalmente no banheiro. Em casa, a perda do equilíbrio pode ser provocada por um tapete solto, um piso escorregadio. Em síntese, uma simples sandália mal adaptada aos pés pode provocar uma queda com consequências drásticas.

    Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 28% a 35% das pessoas com 65 anos ou mais caem a cada ano. Entre as que pertencem à faixa etária acima dos 70 anos, essa probabilidade aumenta, fica em torno de 32 a 42%. Para evidenciar a gravidade desse problema, basta dizer que 40% das mortes relacionadas a lesões são provocadas por quedas. Portanto, enfatizo: o cuidado com os idosos precisa ser redobrado.

    Resolvi escrever este texto, porque, ao atravessar uma rua na faixa de pedestre com a minha mãe, vi que alguns motoristas estavam incomodados com a lentidão. Não tive pressa. Ela atravessou a rua na velocidade dela. Não poderia acelerar para atender à ansiedade deles. Ela, segurando o meu braço, olhando para o chão e apoiada em uma bengala, não percebeu. Ninguém buzinou, mas vi o ar do esforço de alguns pelo exercício da tolerância.

    O etarismo é uma forma de discriminação, de preconceito em relação à senioridade. O Estatuto da Pessoa Idosa foi instituído para regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. O Artigo 3º desse Estatuto determina:

    “É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.”

    Têm sido divertidos os encontros casuais com uma amiga, educadora aposentada, que ainda guarda na memória nomes de seus ex-alunos. Outro dia, na fila do banco, quando peguei a senha de prioridade, ela falou:

    – Você não pode pegar essa senha, ainda não tem idade pra isso!

    – Não poderia até ontem, hoje já tenho direito…

    Depois do abraço pelas felicitações do aniversário, ela me disse:

    – Só vou usar esse direito depois que tiver 80+.

    – Não vou esperar tanto – foi a minha resposta…

    No nosso próximo encontro, direi a ela que já estou com a minha carteirinha de idoso. E agora não tenho mais problema com o troco no banheiro da rodoviária.

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