• O amor em tempo de ódio

  • 02/06/2019 12:00

    O título deste texto, eu o tirei de um poema de Bertolt Brecht. Sei que o escritor colombiano Gabriel García Márquez fez um belo romance no gênero realismo fantástico, contextualizado no século XIX, com o título “Amor em tempos de Cólera”, que foi adaptado para o cinema e teve a participação da grande atriz Fernanda Montenegro. Há também um filme dirigido por Amma Asante, que se passa no período da guerra, em 1944. Aborda o relacionamento amoroso de uma adolescente, filha de uma mãe branca alemã e de um pai negro, que se apaixona pelo filho de um oficial da SS e membro da Juventude hitlerista. Os dois apaixonados são perseguidos por causa da cor da pele da jovem. Em síntese, quero dizer que não há originalidade no título que usei, contudo, acho oportuna uma reflexão sobre o amor neste período em que o ódio encontra terreno fértil na radicalização política, sem deixar espaço para a sensatez. Após ver o vídeo da “cabeçada” dada por um deputado no plenário da Câmara, no dia 29/05, achei oportuno colocar aqui em discussão o conceito de civilidade.

    Hoje amar é um ato revolucionário. É preciso remover a intolerância para dar chance ao diálogo. O país encontra-se estagnado, emperrado, travado por uma prática política viciada ao clientelismo, a uma máquina burocrática que só funciona à base de propina.

     O “levar vantagem” é o desejo da maioria que vive atrelada ao poder nas diversas instâncias. Por isso que, hoje, a honestidade está na esfera da excentricidade. Parodiando Hélio Oiticica, é possível dizer: “seja honesto, seja herói”.

    E, quando me deparo com o discurso da privatização, que já se tornou a ladainha das propostas capitalistas, lembro o que dissera Bertolt Brecht:

    “Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar. É da empresa privada o seu passo em frente, seu pão e seu salário. E agora não contente querem privatizar o conhecimento, a sabedoria, o pensamento, que só à humanidade pertence.”

    Lamento informar: não há como transportar o saber em carro-forte. Portanto, não há como depositá-lo em contas bancárias, nem aqui nem em paraísos fiscais. 

    A cultura é popular. Mesmo os considerados iletrados são capazes de desenvolver, por meio da experiência de vida, um senso crítico, e uma capacidade de discernimento, tendo como base princípios éticos. Fato este que os leva a identificar o que é certo e errado, possibilitando um posicionamento sociopolítico com critérios bem definidos. 

    Os meios de comunicação estão mais diversificados, a informação corre em tempo real. O desmascaramento dos falsos moralistas está ocorrendo de forma mais rápida. É um equívoco achar que o conhecimento se concentra somente nas escolas e nas universidades. O processo educacional ocorre dentro e fora dos estabelecimentos de ensino. É triste ver a falta de investimento em educação pelo medo de ver o povo consciente, bem esclarecido. E assim, a Ciência é também sacrificada.

    É velha a fórmula de criar polarização ideológica para alimentar o ódio. Está provado historicamente que isso não funciona. Só aumenta a violência, criando dissidências. Quando as forças armadas começam a bate no povo, a democracia sangra pelos ralos. E, quando isso ocorre, é hora de usar o discurso das flores, da ternura, da resistência pacífica que não aceita provocação. O povo deve andar de mãos dadas pela paz e contra o ódio. É o momento em que a poesia surge para alimentar a esperança e a arte ecoa o grito de liberdade. Ainda vale o que disse o Profeta: “Gentileza gera gentileza”. 

    — Preservo as minhas utopias.

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