Posturas Excludentes II
“Deve o cidadão desistir de sua consciência e se dobrar ao legislador? Por que então estará dotado de uma consciência? Devemos ser em primeiro lugar homens, e só então súditos”. (Henry Thoreau)
Estamos sendo induzidos ao reconhecimento de “facilidades” no pagamento de escorchantes impostos por serviços que não nos são prestados. A população ingênua agradece, excluída do direito de entender para onde vai a sua contribuição, docemente camuflada de “liberal”. Uma dívida inicial de aproximadamente dois mil reais, pode ser “convertida”, com favores e descontos, em quase doze mil. Isto para quem às vezes não tem sequer a mais elementar segurança de uma calçada inteira.
Ruas e calçadas estão em pedaços, sobras de uma ridícula camada de asfalto apressadamente colocada sobre paralelepípedos, em vésperas de eleições. Caminhões da prefeitura destruíram pavimentações, bueiros e valas, durante o não asfaltamento de alguns trechos. A trepidação consequente de tanta incompetência está causando rachaduras em muros e casas. Reboques estacionados sobre a calçadas suspendem pesadas caçambas de entulho de demolições irregulares, enquanto são erguidas edificações sobre o leito dos rios.
São fatos, devidamente documentados e comunicados à Secretaria supostamente responsável, que não só não responde como, por razões óbvias, desaparece com relatórios que incluem denúncias de possíveis e prováveis tentativas de extorsão. Quem está “do lado de lá” de qualquer mesa costuma irritar-se e assumir postura defensiva quando o óbvio se escancara. Julgando-se também no direito de, com uma canetada, engendrar uma represália contra quem faz denúncias. É assim nas ditaduras. Nos dizem que faz parte das noções de cidadania conservar as calçadas.
Quem sabe deveríamos interceptar os caminhões como fez um dia aquele jovem chinês diante de tanques?
Moro em Petrópolis há 36 anos. Nos 36 anteriores aos ditos (confessei meus 72), fui veranista. Acentuávamos a vocação original da cidade, estimulando a vida cultural, o comércio e as oportunidades de trabalho, participando indiretamente do desenvolvimento em sua forma plena. O primeiro conselho de patronos da UCP, por exemplo, era, em sua quase totalidade, composto por professores, diplomatas e empresários veranistas, convidados por colegas petropolitanos. Ninguém inaugurava placas nem se bajulava e congratulava o tempo todo. Era natural.
Uma política decadente, deslumbrada, histriônica e extorsiva afugentou os veranistas, apressando a realização de reprimidos sonhos de consumo: ocupar os casarões. Em pouco tempo, as avenidas Ipiranga e Koeler estavam irreconhecíveis, deploráveis. Os impostos, estes alcançaram valores de grandes cidades, paradoxo da decadência. E quem não fabrica cerveja nem explora estacionamentos não pode nem sonhar com facilidades. O povo, carente de saúde, de educação, de transporte e até de calçadas, paga por quem é isento. Sempre agradecendo. Agradecidíssimo.