Lucas 12:2: nome de operação da PF contra venda de joias remete a lema bíblico de Bolsonaro
A Polícia Federal (PF) deflagrou nesta sexta-feira, 11, a Operação Lucas 12:2, com o objetivo de investigar um grupo, composto por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro, que teria vendido joias e outros objetos de valor, como esculturas, entregues a autoridades brasileiras em missões oficiais. O nome da ação faz alusão a um versículo bíblico que afirma que nada permanece escondido para sempre.
“Não há nada escondido que não venha a ser descoberto, ou oculto que não venha a ser conhecido. O que vocês disseram nas trevas será ouvido à luz do dia, e o que vocês sussurraram aos ouvidos dentro de casa será proclamado dos telhados”, diz o texto bíblico.
A escolha do nome da operação pela PF remete a outro versículo muito utilizado por Bolsonaro, desde a primeira campanha eleitoral, em 2018. O ex-presidente costumada citar João 8:32, que diz “conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.
De acordo com a polícia, os montantes “obtidos das vendas foram convertidos em dinheiro em espécie e ingressaram no patrimônio pessoal dos investigados, por meio de laranjas e sem utilizar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores”.
Batismo das operações da PF
Nos últimos anos, a Polícia Federal tem batizado operações com nomes em referência a filmes, comidas, expressões populares e acadêmicas, e referências religiosas. As denominações, ora mais informais, ora mais conceituais, sempre trazem consigo uma explicação da própria organização sobre a escolha.
A operação desta sexta-feira não foi a primeira que se inspirou em um trecho da Bíblia. Em 2016, a Operação Timóteo, que investigava um esquema de corrupção em cobranças judiciais de royalties da exploração mineral, fazia alusão a um versículos do livro bíblico de Timóteo. O trecho fala que os que querem ficar ricos caem em tentação, que os leva a mergulharem na ruína e na destruição. Um dos investigados era o pastor e líder da Assembleia de Deus, Silas Malafaia.
Algumas denominações de operação são construídas com base em trocadilhos. Esse é o caso da Operação Dark Side, deflagrada em 2013 para investigar uma quadrilha internacional de tráfico de drogas em que os líderes do esquema eram policiais civis. O nome faz referência à saga de sucesso Star Wars, em que o vilão é conhecido por integrar o lado escuro da Força (Dark Side, em inglês, idioma original da história); e “brinca” com o fato de os policiais investigados terem “mudado de lado”.
Outra ação com título inspirado em filme foi a Operação Flintstones, que, em 2015, buscou recuperar fósseis e artefatos de cavernas. O nome remete ao desenho homônimo, que contava a história de uma família na Idade da Pedra.
Outros nomes são inspirados em fatos reais. Um exemplo disso é a Operação Lava Jato, iniciada em março de 2014. A ideia surgiu a partir do posto de gasolina, separado por cerca de 3 quilômetros do Congresso, que era conhecido por movimentar dinheiro de origem ilegal, ao mesmo tempo em que oferecia combustíveis e lavagem a jato para os clientes.
Recentemente, a PF deflagrou uma operação usando conceitos acadêmicos. É o caso da Operação Venire, que faz referência a um princípio do Direito Civil e do Direito Internacional: a expressão em latim “Venire Contra Factum Proprium”, que, em português, significa “vir contra seus próprios atos”. A investigação apura o envolvimento do ex-presidente Jair Bolsonaro na inserção de dados falsos de vacinação da covid-19 no sistema do Ministério da Saúde.
A mitologia grega também já foi utilizada pela corporação como inspiração para o nome de investigações. Esse é o caso da Operação Hefesto, uma referência ao deus grego da tecnologia, do fogo, dos metais e da metalurgia. A investigação apura um esquema de fraudes em licitações na compra de kits de robótica de 43 cidades de Alagoas. Aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), estão entre os investigados.
Entenda a Operação Lucas 12:2
A operação desta sexta-feira tem como alvos o general Mauro César Lourena Cid – pai de Mauro Cid -, o advogado Frederick Wassef, que representou o ex-chefe do Executivo perante a Justiça, e o tenente Osmar Crivelatti, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A ação vasculhou quatro endereços, sendo dois em Brasília, um em São Paulo e um em Niterói. As ordens foram expedidas pelo ministro do Superior Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes no bojo do inquérito das milícias digitais. São investigados supostos crimes de peculato e lavagem de dinheiro.
Os investigadores suspeitam da venda ou da tentativa de comercialização de quatro conjuntos de presentes dados ao ex-presidente durante a gestão dele. Os itens foram recuperados em março por Wassef e Cid, após o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar a devolução de presentes recebidos por Bolsonaro. A medida foi tomada pela Corte após o Estadão revelar o esquema das joias do ex-presidente.
Tanto Bolsonaro quanto Mauro Cid não foram alvos de buscas na operação desta sexta, pois já tiveram as respectivas residências vistoriadas na investigação sobre inserções de dados falsos de vacinação contra a covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde. Nesse sentido, a PF entendeu que seria “desnecessária a realização de novas medidas cautelares” contra os dois.