• Apoio em Curitiba garante poder e acesso ao presidente

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  • 10/04/2023 07:01
    Por Luiz Vassallo, Davi Medeiros e Beatriz Bulla / Estadão

    Os 580 dias de prisão na Operação Lava Jato moldaram um núcleo restrito de auxiliares e conselheiros de Luiz Inácio Lula da Silva. Este seleto e heterogêneo grupo, formado por quem Lula considera que lhe foi mais fiel e não lhe deu as costas durante seu momento mais dramático – quando parte do PT começava a debater quem herdaria seu espólio político -, exerce agora poder e acesso privilegiado ao presidente em seu terceiro mandato.

    A integrantes da chamada “República de Curitiba” se atribui a indicação de ministros e papel de interlocutores de Lula, com o poder de influenciar nomeações e decisões de governo.

    Este círculo de confiança não é coeso. Não raro, seus integrantes disputam poder e cargos no Palácio do Planalto. É possível comparar a atuação de nomes mais destacados deste grupo com atribuições que, no passado, exerceram ex-ministros petistas como José Dirceu e Antonio Palocci – ambos atingidos por escândalos de corrupção.

    Agora, porém, o grau de influência é considerado menor porque Lula tem se mostrado mais centralizador em suas decisões. Mesmo assim, em diferentes medidas, a “República de Curitiba” participou da formação do primeiro escalão e esboços iniciais da política econômica.

    Dona de um gabinete no Palácio do Planalto, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, fez parte da vigília que acampou ao lado da Superintendência da PF em Curitiba. O namoro foi revelado pelo ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, em suas redes sociais, após uma visita a Lula na prisão, em maio de 2019. Lula e a socióloga se casaram três anos depois, em maio do ano passado. Desde a campanha eleitoral, Janja chamou a atenção e gerou ciúmes pela participação ativa, interferindo na organização de eventos e até na estratégia de comunicação.

    No governo, seu poder ficou mais evidente. Foi organizadora da cerimônia de posse e porta-voz da divulgação de seu cronograma. Sua palavra teve peso na escolha da ministra da Cultura, Margareth Menezes. É presença constante em reuniões do alto escalão e eventos públicos de Lula.

    PROCURAÇÃO

    Desde 2017 na presidência do PT com apoio de Lula, Gleisi Hoffmann recebeu procuração da defesa do petista na Lava Jato para ter o direito de visitá-lo na condição de advogada pessoal. Encampou duras críticas aos principais agentes da operação durante o período de mais alta popularidade das investigações, e pagou preço eleitoral nos últimos anos. Deixou de ser senadora e passou a se candidatar como deputada federal – foi reeleita em 2022.

    Gleisi não tem cargo no Planalto. Mas é ouvida por Lula em decisões importantes. Para a Secretaria-Geral da Presidência, emplacou a nomeação do ex-deputado Márcio Macêdo (PT), que foi tesoureiro do partido. A Secretaria-Geral era cobiçada por amigos próximos de Lula, como o coordenador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio Carvalho, e o deputado estadual Emídio de Souza (PT). Partiu de Gleisi, por exemplo, o alerta para o presidente sobre o anúncio de seus primeiros quatro ministérios sem a presença de mulheres, no começo de dezembro.

    Nas redes sociais e em declarações públicas, ela costuma fazer dobradinha com Lula, como quando torpedeou o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Também se notabiliza por vocalizar o fogo amigo petista no governo.

    Entrou, por exemplo, em rota de colisão com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao se manifestar abertamente contra a reoneração dos combustíveis. Inicialmente, havia expectativa de aumento em até R$ 0,69 no preço da gasolina. Após a intervenção de Gleisi, e a mediação de Lula, o incremento ficou em R$ 0,34. À sua maneira, o ministro se vê vitorioso por ter evitado que a reoneração fosse totalmente descartada.

    Haddad é outro remanescente da fase Lula preso. O ministro da Fazenda reabilitou sua carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para poder visitar o então ex-presidente na prisão, em 2018, quando também se sujeitou a uma difícil campanha eleitoral contra Bolsonaro no auge da crise do PT durante a Lava Jato. Em 2022, entrou nas eleições consciente da difícil tarefa de disputar o governo de São Paulo, Estado historicamente resistente ao partido.

    DEFESA

    Considerado em todas as apostas o favorito para substituir Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal (STF), Cristiano Zanin conheceu Lula por meio de seu sogro, Roberto Teixeira, antigo compadre do petista – para quem emprestou até casa nos anos 1980. Hoje, o advogado está rompido com o sogro, mas em alta com Lula. Defendeu o petista na Lava Jato, e obteve a anulação dos processos.

    O presidente sempre quis usar a defesa para desmoralizar as acusações, e foi por meio da declaração de parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro, atual senador, que encerrou suas pendências com a Justiça. Zanin detém este crédito com Lula. Deixou de ser apenas defensor nos autos para se tornar conselheiro próximo do presidente para assuntos jurídicos e integrou a equipe de transição do governo.

    Lula mantém contato, ainda, com o advogado Marco Aurélio de Carvalho, que militou contra sua prisão na Lava Jato. No Prerrogativas, ele antagoniza com os principais agentes das investigações, alguns que agora estão na política.

    ‘COZINHA’

    O cientista político Carlos Melo, do Insper, avalia que a “cozinha do poder” de Lula em 2003 era mais qualificada, com quadros que vinham de uma formação política robusta, como os ex-ministros Luiz Gushiken e Márcio Thomaz Bastos – muito influentes no primeiro mandato. Segundo ele, a postura mais centralizadora do petista demonstra cautela diante de um País que não tem os recursos políticos que já teve no passado.

    O entorno do presidente, naquela época, era composto por pessoas que o conheciam desde os tempos de líder sindical. “Isso dava uma proximidade, uma facilidade para ser crítico. Hoje, não é a mesma coisa. Essa ‘República de Curitiba’ é formada por pessoas que têm com Lula uma relação de deferência, que o conheceram como presidente ou ex-presidente, ou seja, depois do poder”, destacou Melo.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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