• Ideologia animal

  • 02/09/2018 07:00

    A temática da consideração ética com os animais é tema cada dia mais relevante em nossa sociedade. Na esteira do avanço e apoio das pesquisas científicas, que categorizam os animais como seres sencientes – capazes de sentir dor e sofrimento semelhante ao nosso –, e do atual contexto de disseminação massiva de idéias contra a exploração animal indiscriminada, os debates acerca da ampliação da comunidade moral para os animais, tem sido cada vez mais tematizada como campo social e teórico. Neste contexto, muitas organizações estão reagindo a esta demanda social utilizando a publicidade ostensiva para divulgar práticas de bem-estar animal no seu dia a dia. Entretanto, o que elas dizem não condiz com o que elas fazem. Na ânsia de manter altas taxas de lucratividade, as organizações omitem do público processos de abuso e sofrimento animal em sua produção industrial e comercialização. Para tanto, as organizações se utilizam de um forte aparato ideológico disseminado socialmente, o carnismo, para expor a indissolúvel necessidade de continuação de suas atividades. O carnismo aqui entendido como ideologia dominante, busca tornar natural, conteúdos históricos acerca do consumo e produção da carne de alguns animais, tornando legítimo e exponenciando processos de abuso e exploração destes. Logo, pelo advento da ideologia carnista, que suporta uma objetificação real e simbólica de alguns animais nas cadeias produtivas e no interior das subjetividades, as corporações se sentem confortáveis em manter um horizonte de desconsideração ética dos animais não humanos nos seus sistemas produtivos, categorizando esta relação como um aspecto do “Dark Side” das organizações. Com relação a atuação no nosso organismo, pessoas que possuem dietas que incluem comidas de origem animal têm mostrado ter maior probabilidade de ter doenças degenerativas, incluindo doenças do coração. De acordo com o Guia de Nutrição para Americanos de 2010, um relatório emitido pelo Departamento de Agricultura Americano e o Departamento de Saúde e Serviços Humanos Americano, uma dieta vegetariana é associada com baixos níveis de obesidade e risco reduzido de doenças cardiovasculares. O Carnismo é um sistema de crenças invisível, ideologia que justifica a matança de certas espécies de animais para consumo da sua carne. É descrito como um paradigma invisível, uma hegemonia, e uma "omissão inquestionável". Neste sistema de crenças é central a classificação de apenas alguns animais como comida, o que justifica tratar estes animais de forma que pode ser considerada como crueldade animal se aplicada a outras espécies que não são consideradas comida. Esta classificação é relativa à cultura. Por exemplo, no Ocidente a vaca, o frango e o porco são considerados comida, enquanto que o cão não o é. Já na China, os cães podem ser mortos para consumo como carne de cão, enquanto que na Índia, as vacas são sagradas.  Deve, assim, ser matéria de análise o paradoxo aparente no comportamento generalizado das pessoas em relação aos animais – elas demonstram compaixão para com algumas espécies enquanto se alimentam de outras. Este fenômeno é conhecido como o paradoxo da carne, no qual pessoas que se opõem aos maus tratos animais no entanto são carnívoras. “No momento, nosso mundo de humanos é baseado no sofrimento e na destruição de milhões de não-humanos. Aperceber-se disso e fazer algo para mudar essa situação por meios pessoais e públicos, requer uma mudança de percepção, equivalente a uma conversão religiosa. Nada poderá jamais ser visto da mesma maneira, pois uma vez reconhecido o terror e a dor das outras espécies, você irá, a menos que resista à conversão, ter consciência das permutações de sofrimento interminável, em que se apoia a nossa sociedade.” – Arthur Conan Doyle.

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