• Peça premiada, ‘Gagarin Way’ une o protesto ao bom humor

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  • 13/12/2022 07:03
    Por Dirceu Alves Jr., especial para o Estadão / Estadão

    Caso morasse em São Paulo, o dramaturgo escocês Gregory Burke, de 54 anos, teria grandes chances de ser amigo do diretor Mário Bortolotto e contabilizar garrafas de cervejas nos bares junto da turma do Cemitério de Automóveis. O autor, que até agora era inédito nos palcos brasileiros, trabalhou como lavador de pratos e se mantinha com serviços temporários até o teatro virar uma fonte de renda.

    Sua primeira peça, Gagarin Way, escrita em 2001, foi aclamada no Festival Fringe de Edimburgo daquele ano, faturou uma série de prêmios e, montada em mais de dez países, aliviou as finanças de Burke – sem, no entanto, mexer com suas convicções. A temática de sua obra permanece relacionada às desigualdades sociais e ao cotidiano de personagens entre a opressão e a violência.

    Foi o ator e artista plástico Carcarah quem apresentou o texto para Bortolotto. “Li e achei que tinha tudo a ver com o nosso trabalho, porque é uma peça que mostra pessoas sem perspectivas em um sistema em que nem o socialismo e nem o capitalismo deram certo”, ressalta.

    PRESENCIAL

    Crítico, violento, de forte carga política, mas sem perder o bom humor, Gagarin Way está em cartaz na sede do Cemitério de Automóveis, na Rua Francisca Miquelina, 155, na Bela Vista, com apresentações de quinta a domingo, até o dia 18. É o primeiro espetáculo inédito e presencial do grupo em três anos. A história é ambientada em uma região que carregava uma resistente tradição socialista. A queda do Muro de Berlim e a implantação de grandes indústrias na área, porém, definharam a economia e a esperança das famílias menos abonadas.

    Gary (Bortolotto) anda cansado e deprimido. Pai de três filhos, o operário arrasta um casamento fracassado e põe na cabeça que precisa desafiar os poderosos locais em nome da retomada dos ideais socialistas. Para isso, sequestra Frank (Nelson Peres), membro da alta administração, com a cumplicidade do amigo Eddie (Carcarah) e do sonhador Tom (Daniel Sato).

    Para Bortolotto, a dramaturgia de Burke dialoga fortemente com o atual momento do Brasil, em que metade da população se despede eufórica do atual governo e deposita esperanças excessivas no mandato do futuro presidente. “A falta de perspectivas bateu forte entre todos nós e, claro, precisamos nos apegar a alguma coisa, mas eu me considero anarquista, não acredito em partido político nenhum”, diz.

    Como artista, Bortolotto garante que está acostumado a tirar leite de pedra e que os sucessivos cortes na área da cultura são o que menos o incomoda nas políticas públicas. “Inaceitável é ver as pessoas passando fome, vasculhando lixo em busca de comida, e tanta gente fazendo de conta que nada está acontecendo.”

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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