• Sofre o fim do mundo

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  • 13/11/2022 08:00
    Por Mons. José Maria

    Estamos no penúltimo domingo do Ano Litúrgico. A Palavra de Deus convida-nos a meditar no fim último do homem, no seu destino além da morte. A meta final, para onde Deus nos conduz, faz nascer em nós a esperança e a coragem para enfrentar as adversidades e lutar pelo Advento do Reino.

    O Profeta Malaquias fala do juízo final, com acentos fortes: “Eis que virá o dia, abrasador como fornalha…” (Ml 3, 19).

    O texto do Evangelho (Lc 21, 5-19) é uma parte dos famosos discursos escatológicos de Jesus. Podemos interpretá-lo como anúncio de desventuras: aí se fala de guerras, revoluções, terremotos, carestias e pestes. Na realidade, ao invés, é um anúncio de paz. As desventuras – de acordo com o que o Evangelista Lucas diz à Igreja – continuarão a existir, porque fazem parte integral da história humana; não foi Jesus que as trouxe, o que Jesus trouxe foi, antes, a possibilidade de vencê-las mediante a fé em seu nome: “Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça. É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!” (Lc21, 18-19). 

    O texto não pretende incutir medo, falando do “fim do mundo”, mas fortalecer a esperança em Deus para enfrentar os dramas da vida e da história; esperança que devemos ter ainda hoje, apesar do que vemos…

    Sobre o fim do mundo, muitos querem saber: quando será e como acontecerá? A expressão fim do mundo costuma transtornar alguns! Porém, para os cristãos, é a volta gloriosa de Cristo; Deus entra em cena de maneira decisiva, traz o final da história e inaugura o seu Reino definitivo de justiça, bondade e glória.

    São Paulo (2Ts 3, 7-12) fala da comunidade de Tessalônica, perturbada por fanáticos que pregavam estar próximo o fim do mundo, por isso não valia a pena continuar trabalhando. Paulo diz: “Quem não quer trabalhar, também não deve comer…” (2Ts 3, 10). O Apóstolo ressalta a importância do trabalho para a vida do homem.

    A vida é realmente muito curta e o encontro com Jesus está próximo. Isto ajuda-nos a desprender-nos dos bens que temos de utilizar e aproveitar o tempo; mas não nos exime de maneira nenhuma de dedicar-nos plenamente à nossa profissão no seio da sociedade. Mais ainda: é com os nossos afazeres terrenos, ajudados pela graça, que temos de ganhar o Céu.

    Para imitar Cristo, que trabalhou como artesão a maior parte de sua vida, longe de descuidar as tarefas temporais, os cristãos “estão mais obrigados a cumpri-los, por causa da própria fé, de acordo com a vocação a que cada um foi chamado (GS, 43).

    O trabalho é o meio ordinário de subsistência e o campo privilegiado para o desenvolvimento das virtudes humanas: a rijeza, a constância, o otimismo por cima das dificuldades… A fé cristã impele-nos além disso a comporta-nos como filhos de Deus com os filhos de Deus, a viver um espírito de caridade, de convivência, de compreensão, a tirar da vida o apego à nossa comodidade, a tentação do egoísmo, a tendência para a exaltação pessoal, a mostrar a caridade de Cristo e os seus resultados concretos de amizade, de compreensão, de afeto humano, de paz. Pelo contrário, a preguiça, a ociosidade, e o trabalho mal acabado trazem graves consequências. “A ociosidade ensina muitas maldades” (Eclo 33, 29), pois impede a perfeição humana e sobrenatural do homem, debilita-lhe o caráter e abre as portas à concupiscência e a muitas tentações.

    Durante séculos, muitos pensavam que, para serem bons cristãos, bastava-lhes uma vida de piedade sem conexão alguma com as suas ocupações profissionais no escritório, na fábrica, no campo, na Universidade… Muitos tinham, além disso, a convicção de que os afazeres temporais, os assuntos profanos em que o homem está imerso de uma forma ou de outra eram um obstáculo para o encontro com Deus e para uma vida plenamente cristã. A vida oculta de Jesus veio ensinar-nos o valor do trabalho, da unidade de vida, pois com o seu trabalho diário o Senhor estava também redimindo o mundo.

    O fiel cristão não deve esquecer que, além de ser cidadão da Terra, também o é do Céu, e por isso deve comportar-se entre os outros de uma maneira digna da vocação a que foi chamado, sempre alegre, irrepreensível e simples, compreensivo com todos, bom trabalhador e bom amigo, aberto a todas as realidades autenticamente humanas (cf. Fl. 1, 27; 2, 3-4; 2, 15; 4,4).

    Jesus (Lc, 21, 5-19) alerta sobre os falsos profetas: “Cuidado para não serdes enganados…” (Lc 21, 8). Diante das catástrofes Jesus exorta à esperança: não ter medo… Esses sinais de desagregação do mundo velho não devem assustar, pelo contrário são anúncio de alegria e esperança, de que um mundo novo está por surgir. “Quando essas coisas começarem a acontecer, levantem-se, ergam a cabeça, porque a libertação está próxima” (Lc 21, 28). A vida do discípulo no mundo assume, de repente, um aspecto novo: é vida de espera, por isso de vigilância; é vida de peregrinos a caminho, não de domiciliados e de sedentários.

    “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida” (Lc 21, 19). Aproveitemos o tempo! Diante das dificuldades não nos deixemos levar pelo desânimo! Acreditemos na Vitória final do Reino de Cristo.

    Na nossa vida cotidiana, no exercício da nossa profissão, encontraremos naturalmente, sem assumir ares de mestres, inúmeras ocasiões de dar a conhecer a doutrina de Cristo: numa conversa amigável, no comentário a uma notícia que está na boca de todos, ao escutarmos a confidência de um problema pessoal ou familiar… O Anjo da Guarda, a quem tantas vezes recorremos, porá na nossa boca a palavra certa que anime, que ajude e facilite, talvez com o tempo, a aproximação mais direta de Cristo das pessoas que trabalham conosco.

    Cristo nos garante: “Coragem, levantai a cabeça, porque se aproxima a libertação”.

    Hoje Jesus quer nos curar da curiosidade de saber o quando e o como acontecerá o chamado fim do mundo. Espera uma atitude existencial de empenho e de esperança, em um tempo dado a nós para nossa conversão. Jesus quer sacudir as consciências, não aterrorizar. Faz por amor. Porque a única realidade que realmente importa, a única que define a eternidade, é a relação com Ele.

    Podemos dizer como São Paulo: “Ele me amou e se entregou por mim” (Gl 2, 20). Ninguém pode nos amar como Ele ou terá melhores intenções que Ele. Dizia São Francisco de Sales: “Se eu pudesse escolher entre ser julgado por Deus e por minha mãe, escolheria Deus”.

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