‘Problema de uma unidade não pode afetar a outra’
Constantemente reconhecida em prêmios de governança corporativa, a Natura & Co se viu em uma posição inédita em sua história: no mês passado, veio à tona uma reunião da empresa com fundos de investimento para falar sobre resultados ainda não divulgados, ferindo um pilar básico de transparência. Além disso, enfrentava a descrença do mercado: as ações, em 12 meses, recuavam mais de 70%. Para dar um “giro” e retomar a confiança, a empresa trouxe para a operação um velho conhecido do mercado brasileiro: o executivo Fabio Barbosa.
Ex-presidente do ABN/Real, Santander e do Grupo Abril, Barbosa sempre teve uma atuação associada ao meio ambiente e à governança corporativa, ainda antes de ESG – sigla em inglês para as áreas ambiental, social e de governança – ser moda.
O executivo diz que chegou para arrumar a casa, desburocratizar o negócio e trazer eficiência para uma estrutura inchada. Ele substitui Roberto Marques, que irá para o conselho e depois deve se aposentar.
Ao jornal O Estado de S. Paulo e ao Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), o executivo contou que a decisão de mudar os rumos do grupo – que é dono das marcas Natura, Avon, Aesop e The Body Shop – diz que os problemas de uma marca não poderão mais afetar o crescimento de outras e também do negócio como um todo.
Na conversa, ele admitiu que colocar a Avon global para dentro de casa foi mais complexo do que a empresa inicialmente previa – a compra foi fechada às vésperas do início da pandemia de covid-19.
A mudança de comando, anunciada na quarta-feira, antes da abertura do mercado, foi bem recebida. Os papéis da Natura subiram na quarta 7,93%, fechando o dia a R$ 15,10.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:
É um momento conturbado na companhia, e um dos questionamentos tem sido sobre a comunicação com o mercado. Como é assumir a empresa nesse momento?
A mudança de estratégia foi pensada porque existe uma preocupação do que se pode fazer para a empresa recuperar seu crescimento. A empresa sofreu com a questão de covid e coisas do gênero, com externalidades, o que afetou nossos resultados. A estratégia que vinha sendo montada na empresa, de buscar as sinergias, norteou os primeiros anos das aquisições. Agora isso fica em segundo plano.
O mercado não vê as capturas de sinergia com a Avon aparecendo nos números da companhia…
Onde foi possível capturar oportunidades de sinergia, isso foi feito. Percebemos, porém, que estávamos insistindo numa busca de sinergias e perdendo o foco em cada um dos negócios. A complexidade da organização impede que se tenha uma visão clara em relação às sinergias capturadas. A busca de sinergias acabou amarrando a empresa.
A leitura de alguns investidores é de que a Avon estava mais deteriorada do que a empresa imaginava. É por isso que a empresa decide agora tocar os dois negócios separados?
A visão de que a Avon tem mais complexidade do que imaginávamos é correta. A integração possível era na América Latina. Ao redor do mundo, o que se podia buscar eram integrações operacionais. Isso foi feito. Agora, tendo as dificuldades que a Avon teve, inclusive com pressões de distribuição, logística e cadeia de abastecimento, a ideia é de que um negócio não pode distrair o outro.
E o que precisa mudar?
Queremos agora evitar que a atividade de uma das unidades de negócio interfira em outra. Ouvimos os investidores e essa mudança tem a ver com algumas coisas. A primeira foram as dificuldades que o mercado impôs para todos. Depois, as dificuldades internas que nos foram passadas. E, em terceiro lugar, o que ouvimos de investidores. É lógico que temos problemas internos. O comitê de transição servirá para entrar em nível de detalhe que não consigo entrar agora e saber o que será feito em relação a pacote de remuneração, processos de alocação de capital, por exemplo.
E quais são as prioridades?
Primeiro, é olhar a questão do pacote de remuneração, como alinhar os incentivos a essa nova estrutura. Depois, estabelecer uma disciplina de alocação de capital e definir quais são os pontos que merecem alocação de capital.
Como foi a primeira conversa para assumir a presidência executiva da Natura?
Estou no conselho (de administração) da Natura há seis anos e vinha se discutindo um plano para dar mais agilidade. Foi uma situação crescente e fui questionado se não poderia fazer isso. Adoro a Natura, e agora preciso ajudar a companhia. Foi um processo de construção do projeto que começou há seis meses. E, (da decisão sobre) meu nome até (assumir) o cargo, dois meses.
E como ficam os planos de a empresa listar suas ações nos EUA?
Está tudo on hold (em suspenso).
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.