• A chegada do menino

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  • 23/12/2017 13:00

    Há uma dobra dourada no manto púrpura com que dezembro se veste. Dela se estende o tapete de nuvens pelo qual adentra nosso coração o cortejo de estrelas. A História Sagrada, que se rememora e reinaugura porque sempre haverá quem a ignore. Ou a esqueceu. Ou a escutou mas jamais a viveu. A Chegada do Menino. Dezembro-João-Batista. Para isso existe, não nos confundamos. 

    Mistérios que a ciência jamais desvendará moram em dezembro. Deus se fez carne no ventre da virgem. A mulher simples, de cabelos negros em cortina sobre os grandes olhos de mirar anjos. A mulher menina que trará Deus ao mundo acaricia a redonda barriga, berço da Realeza Divina. José operário, carpinteiro de mãos empedradas mas que sabe os afagos corretos que a ternura da noite demanda. Mão firme de quem será padrasto de Deus. 

    Tem essa ópera mestra inaugurada por corais de milhares de anjos entoando glórias desde que o crepúsculo abriu a noite por suas cortinas de ouro. Uma orquestra acompanha. Pássaros gorjeiam sinos. Riachos percutem nas pedras. Ventos clarinetam as montanhas. Jardins desenrolam as pétalas em sussurros violinos. Baleias solfejam nos oceanos. Ondas marimbam as areias. E embaixo, os pastores, com as ovelhas agitadas, assistem, pasmados, ao espetáculo. As estrelas refletores. Novas estrelas nascidas. Cometas rodopiando o infinito. Traçam caminhos. Os reis magos desvendam e percebem: Deus vem aí. 

    Enquanto isso, o burrinho leva a mãe quase parindo, de porta em porta, sem que José lograsse hospedagem. Deus vai chegar sem palácio, um Rei sem teto. Mas José é um tipo de desbravador que pode fazer de uma caverna, um castelo. A cocheira. Servirá. Somos gente simples, disse José. Importa haver aconchego. Maria sorri enquanto José ajeita a palha no canto que servirá de leito. O Rei das Galáxias chega entre dores de Maria e mugidos de animais. José a ampara, ajuda. O bebê é banhado, Maria se recupera, enxuga o rosto com lágrimas de cristal. E dá de mamar a Deus. Canta-lhe hebraicas canções de ninar. José, muito prático, já fez do cocho a manjedoura conhecida. Limpa, acolchoada de palha fresca, um pano vestindo as fibras douradas. Logo o bebê lá está, dormindo com estrelas gotejando nas pálpebras.

    Aos poucos a cena perfeita, que completa assim nunca houve, mas que merece existir, se realiza. Chegam os pastores com seus cajados e ovelhinhas travessas ao colo. Os reis magos descem dos camelos e fazendo contraste com os rústicos pastores, ajoelham-se com seus mantos refinados e depositam oferendas. O ouro, o incenso, a mirra. Os anjos agora não cantam, fazem um murmúrio de boca chiusa para embalar o Deus Menino. As galáxias se dobram para observar. Aquele cocho é o centro do mundo, cerne da história.

    Como um flash esse entendimento súbito ilumina esse Papai Noel na porta da loja. Lá estava com sorriso triste e sineta estridente, entre pessoas em torrentes de impaciência pelas ruas, carros engarrafando as urgências de quem precisa cumprir agendas de mil famílias. Ele, que sempre ouviu essa história, tem um alumbramento. Como se algo nele se inaugurasse. Como se a ficha caísse. Uma estrela em sua testa. E ele canta. Dança. E ri. E cumpre as fotos com as crianças, mas anuncia: Jesus nasceu… Jesus nasceu. Jesus nasceu! Alguns o olham como um louco. Outros entendem. Tanto faz. Ele está em paz. Seu coração todo manjedoura passa o resto do ano cantando a Boa Nova. A Maravilha chegou! A Vida.

     denilsoncdearaujo.blogspot.com

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