• Campanha esquenta com troca de acusações entre caciques da política

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  • 06/05/2022 13:36
    Por Felipe Frazão / Estadão

    A cinco meses da eleição, caciques tradicionais da política começaram a trocar hostilidades e acusações públicas de corrupção. Antigas rivalidades regionais se acirraram novamente, opondo políticos que foram chefes do Poder Legislativo e até um presidenciável.

    “Cínico”, “ladrão”, “tirano” e “venenos” são alguns dos adjetivos disparados em redes sociais e entrevistas. Por enquanto, o foco está no Nordeste. No Ceará, a briga da vez envolve o ex-presidente do Congresso, Eunício Oliveira (MDB) e Ciro Gomes, pré-candidato a presidente do PDT. Eles já dividiram o mesmo palanque no passado, mas têm um histórico de desavenças. Em Alagoas, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressista) e o senador Renan Calheiros (MDB) trocam insultos.

    Na contenda cearense, Eunício cobrou que Ciro explique o uso de um apartamento em Paris, na França, e imóveis no Rio e em São Paulo. Também afirma que o adversário pedetista costuma voar em um jatinho que estaria registrado em nome de um empresário, dono de uma siderúrgica no Estado.

    “Ele (Ciro) diz que eu tenho um apartamento em Miami. Eu tenho, está declarado no Imposto de Renda. O que ele fica em Paris eu não sei quem paga. Como ele vive nababescamente, tem apartamento em Fortaleza, no Rio, em São Paulo? O avião que ando é meu, está declarado em nome da minha holding. Ele anda há cinco anos num jatinho que não sei de quem é e quem paga”, afirmou Eunício ao Estadão.

    Os ataques foram uma resposta à acusação de Ciro, segundo quem o ex-senador foi beneficiado no governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidenciável do PT, com um contrato de R$ 1 bilhão na Petrobras. “O Lula deu para ele (Eunício) um R$ 1 bilhão, com B de bola, sem licitação da Petrobras para a empresa dele, Manchester. Virou um bilionário, sendo um cara de Lavras da Mangabeira que veio para Fortaleza com uma mão na frente e outra atrás. E agora é um bilionário com apartamento no estrangeiro”, declarou Ciro Gomes, a uma rádio.

    Em um áudio divulgado em rede social, Eunício devolveu: “Cínico, mentiroso, na minha casa nunca entraram para saber se tinha dinheiro não. Na sua foram atrás, Ciro”.

    A rusga é mais antiga e também envolve bens. Eunício arrematou em leilão, no ano passado, um apartamento de R$ 520 mil que pertencia a Ciro, mas que havia sido bloqueado para pagar indenização por ofensas ao ex-presidente e senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL). Collor venceu ação de danos morais depois que Ciro o chamou de “playboy safado” e “cheirador de cocaína”, numa entrevista à rádio Jangadeiro BandNews. Ciro afirma que Eunício comprou o apartamento apenas para “humilhá-lo” e que só denuncia casos em nome da “decência”.

    A rivalidade hoje tem como pano de fundo não só a composição dos palanques no Ceará, mas a disputa presidencial. Eunício apoia a candidatura do ex-presidente Lula ao Palácio do Planalto. Segundo ele, Ciro não tem condição de ser um nome da terceira via, mas sim da “3ª Delegacia”. Ele afirma que Ciro precisa explicar como paga suas contas e custeia despesas pessoais, além da origem de seu patrimônio, porque “nunca trabalhou”, nem recebeu herança.

    Alagoas

    Em Alagoas, há outro embate escancarado, que envolve não só as eleições de 2022 como a disputa pelo governo-tampão no Estado, cargo que ficou desocupado depois da saída de Renan Filho (MDB) do cargo de governador. O político renunciou há um mês para disputar uma vaga no Senado ao lado do pai, o ex-presidente do Senado Renan Calheiros. Os Calheiros são adversários de Arthur Lira, aliado do presidente Jair Bolsonaro.

    Quem está à frente do governo de Alagoas desde que Renan Filho saiu é o presidente do Tribunal de Justiça, Klever Rêgo Loureiro. O ex-vice-governador, Luciano Barbosa (MDB), já havia deixado o cargo em 2020, quando disputou e venceu a eleição para a prefeitura de Arapiraca.

    O candidato de Lira para o mandato-tampão é o senador Rodrigo Cunha (União Brasil). O clã Calheiros apoia o deputado estadual Paulo Dantas (MDB). Calheiros acusou o presidente da Câmara de ser um “golpista” e “tirano” no debate sobre a eleição indireta para governador em Alagoas. Afirma também que Cunha é um “senador que nada faz” e que “se vendeu ao Centrão”. Isso porque o grupo político de Lira recorre à Justiça para adiar a eleição no Estado.

    “A independência dos poderes é sagrada. Quarteladas, afrontas aos poderes e desacato às decisões judiciais são condutas de tiranos em qualquer lugar”, escreveu Renan Calheiros, no Twitter.

    Lira devolveu, chamando Renan de “venenoso” e disse que quem entende de golpe é o senador. “Em Alagoas, achaca e interfere nos poderes”, disparou o presidente da Câmara. “Sobre dar golpes, o senador Renan Calheiros entende bem. Foi assim que tentou conduzir o Congresso Nacional e, várias vezes, desrespeitou decisões judiciais.” No Twitter, Lira citou o poema “No Meio do Caminho” de Carlos Drummond de Andrade para dizer que a “pedra” no caminho de Renan sempre foi e será a lei.

    Os embates deste ano reeditam bate-bocas notórios entre caciques políticos. Em 2000, o plenário do Senado parou para assistir o bate-boca entre o então presidente da Casa, senador Antônio Carlos Magalhães, (PFL-BA) e Jader Barbalho (MDB-PA). Foi no dia 5 de abril daquele ano. Ambos eram da base de apoio do presidente Fernando Henrique Cardoso, mas se estranharam por conta de disputas políticas. Jader seria presidente do Senado um ano depois.

    Na época, ACM, como era conhecido o político baiano, tinha contra si um pedido de investigação no Conselho de Ética. Barbalho tirou proveito do episódio para cobrar que o presidente do Senado deixasse o cargo. Ao ouvir Jader discursar, ACM tentou interrompê-lo: “Os nossos motivos são diferentes: o seu caso é de desonestidade”, declarou. Jader devolveu com uma frase que entrou para os anais da Casa: “Não concedi aparte. Fique calado. Ouça calado aí. Fique caladinho aí”.

    No final do longo discurso, o senador paraense ironizou: Tenho a impressão de que o grande baiano Dorival Caymmi se inspirou no senador Antônio Carlos Magalhães para fazer esta canção, com a qual eu encerro o meu discurso: João valentão é brigão para dar bofetão e nem pensa na vida. A todos, João intimida. Faz coisas que até Deus duvida. Mas a nós não mais”. ACM pediu a palavra para dar o troco: “De nada valeu a minha piedade cristã. Por piedade cristã, não mostrei os furtos, anunciados em todos os jornais não só da sua terra, como de todo o Brasil, do Senador Jader Barbalho. Estão todos ali, como estão aqui”.

    Na Paraíba, na década de 1990, as diferenças políticas foram resolvidas à bala. Em 1993, o então governador do Estado, Ronaldo Cunha Lima, deu três tiros no antecessor Tarcisio Buriti que havia feito declarações públicas levantando suspeitas sobre a conduta do filho do governador, Cássio Cunha Lima, na época com cargo no governo federal. O processo criminal chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e Ronaldo Cunha Lima, em 2007, renunciou ao mandato de deputado federal para se livrar do julgamento na Corte.

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