• Peça ‘Zoológico de Vidro’ revela os estilhaços de uma família destruída

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  • 30/04/2022 07:00
    Por Ubiratan Brasil / Estadão

    Dispostos a encenar uma peça que tratasse de temas atuais – como o fundamento moral da civilização ocidental e a violência a que as mulheres são submetidas -, os atores Thais Müller e Guilherme Trindade encontraram respostas não em um texto contemporâneo, mas em um escrito em 1943 e que, ao ser montado pela primeira vez no ano seguinte, logo se tornou um clássico: Zoológico de Vidro, de um dos gigantes da dramaturgia norte-americana, Tennessee Williams (1911-1983).

    “Williams tem uma ‘mordedura’ maravilhosa para falar e expor as questões familiares, o que continua atual mesmo quase 80 anos depois”, observa Lavínia Pannunzio, atriz que assume a direção da montagem que estreou no Sesc Santo André. Ela foi convidada pela dupla de atores, que também convocou Sandra Corveloni e Bruno Rocha para compor o elenco. Juntos, estudaram o original para destacar o que despontaria como perfeito reflexo da sociedade atual.

    “Questionamos o fundamento moral da civilização ocidental, a violência a que as mulheres são submetidas e que atravessa esse texto como uma das camadas da estrutura opressiva e hierárquica e as brutalidades promovidas pelo capitalismo e pela filosofia judaico-cristã. E, mais do que nunca, é tempo de reparações”, continua Lavínia.

    Como uma joia bem lapidada, o texto acompanha a família Wingfield, que vive em St. Louis, no Meio-Oeste americano, nos anos 1930, quando a depressão econômica arruinou populações inteiras. A mãe, Amanda (Sandra Corveloni), é uma mulher amargurada, que deposita sua felicidade na realização dos filhos. Eles, porém, são a própria imagem do fracasso – Tom (Guilherme Trindade) é um poeta que trabalha em uma loja de calçados. Narrador da história (portanto, alter ego do autor), ele sonha em deixar a casa, mas, frustrado, consome-se na bebida.

    Introvertida, frágil, Laura (Thaís Müller) é a irmã de Tom. Por causa de um defeito físico nas pernas, vive imersa em seus sonhos, escapando da realidade para se aconchegar na coleção de bichinhos, o zoológico de vidro que inspira o título da peça.

    SALVAÇÃO

    Consciente da tragédia vivida pelos filhos, embora disposta a oferecer-lhes uma realidade mais feliz, Amanda convence Tom a convidar um amigo do trabalho, Jim (Bruno Rocha), a vir conhecer Laura e, espera a mãe, casar-se com ela. Afinal, otimista, carismático, Jim é o protótipo do homem sonhado pela fracassada família.

    “Como a narrativa da peça é muito importante, trabalhei para que Guilherme, que vive Tom, interpretasse a história da melhor forma possível. Hoje, ele seria um MC da trama”, observa Lavínia. “Isso é importante porque, apesar de todos os personagens estarem envolvidos no drama de alguma maneira, não poderíamos ignorar a força do pensamento, das questões atuais.”

    A peça tornou-se conhecida no Brasil com o título À Margem da Vida e recebeu montagens memoráveis como a de 1976, dirigida por Flávio Rangel. Em todas versões nacionais (Cássia Kis também protagonizou uma, encenada por Ulysses Cruz em 2009), a fluência dos diálogos possibilita uma alternância no ritmo das falas, combinando uma sucessão muito rápida com momentos de silêncio.

    “Williams realmente coloca todas as cartas na mesa, aponta para todas as feridas e exalta a cafonice que marca a visão romântica do que pode ser uma vida familiar. Com isso, os personagens têm liberdade para fazer muitos acertos de contas, exibir seu medo, criar tensão, revelar uma pulsão sexual, além de se sentirem muito abandonados”, comenta a diretora.

    Zoológico de Vidro

    Sesc Santo André.

    Rua Tamarutaca, 302, Vila Guiomar, Santo André. Tel. (11) 4469-1200.

    6ª, 21h. Sáb., 20h.

    R$ 40. Até 28/5

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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