Aborto – a coragem de Rebeca
Assunto em debate há vários anos e atualmente em foco no Congresso, mas com comissão duvidosa, com maioria de homens, uma aberração desproporcional, quando deveria ser constituída somente de mulheres. Não sou a favor nem contra por ser um assunto atinente a elas somente – e esta visão vem de longa data, tanto que, há muitos anos escrevi o soneto “DÉLIVRANCE” DE UM EMBRIÃO:
“Desprezado embrião sendo gerado / que, dizem, ter direito pleno à vida,/ dentro do ventre de u’a mãe ferida,/ imputando-lhe tão grande pecado.
Ninguém tem o domínio assim velado / para opinar qual a melhor medida,/ sem garantir qualquer boa acolhida / em mundo podre, vil, degenerado.
Cale-se o homem sempre irresponsável: / lança semente, sem hesitação,/ fertilizando solo desdenhável.
Deixemos à mulher, somente então / tida como culpada, o insofismável / e supremo direito à decisão.”
Há, como em todos os casos, uma eterna hipocrisia religiosa, quando tal preconceito não se estende até outras mazelas da vida, por esses políticos indiferentes que julgam “pecado” um aborto mas não o desvio de verbas da saúde para a devida proteção à mulher.
Surge agora no noticiário, o drama da jovem Rebeca, estudante de direito, que procurou os meios legais dentro de nosso país e, não tendo recebido eco, pela indiferença de nossa justiça, procurou a solução “legal” na Colômbia, onde o aborto é autorizado. Agora questiona-se se cometeu ou não um crime. É a eterna hipocrisia de uma lei que não poderá atingi-la. Se cada um é dono de seu corpo e pode fazer dele o que quiser, porque tal direito não o terá também as mulheres – é o “livre arbítrio” de cada uma tomar tal decisão, que não poderá ser obrigatório nem proibido. O que não se pode é querer impedir uma medida que somente a elas compete e não se escorar em religiosidade duvidosa.
Como sempre, me escoro em fatos, não por ter optando por tal solução no passado mas sim, pelo fato de minha mulher ter tido um parto que, praticamente a levou à morte, sendo salva pelo médico que lhe devolveu a vida. Em função do fato, na gravidez seguinte procurei o mesmo médico, “contratando-o” para uma cezária e consequente laqueadura. Tudo acertado, minha parte honrada com tudo que me foi cobrado e no dia, ao se dirigir para a sala de cirurgia, confirmei as providências com o médico e, me descontrolei quando tive a resposta – de que não iria fazer o procedimento por sua “religião” não permitir. As consequências todos podem imaginar e não o impedi para preservar a vida dela, mas justifiquei à Irmã Epinhause, diretora do hospital, que a tudo assistia – “Ele tem todo o direito de respeitar sua religião, mas a obrigação de ter caráter”. jrobertogullino@gmail.com