• Rosa nega arquivar inquérito contra Bolsonaro por prevaricação no caso Covaxin

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  • 30/03/2022 14:13
    Por Pepita Ortega / Estadão

    A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido do procurador-geral da República Augusto Aras para arquivar a investigação aberta contra o presidente Jair Bolsonaro por suposta prevaricação no caso Covaxin. A ministra rechaçou a alegação do PGR de “não seria possível identificar a atribuição ao Chefe de Estado do dever de ofício de reportar irregularidades de que teve ciência, no âmbito da administração pública federal, aos órgãos de fiscalização e investigação”.

    “Ao ser diretamente notificado sobre a prática de crimes funcionais (consumados ou em andamento) nas dependências da administração federal direta, ao Presidente da República não assiste a prerrogativa da inércia nem o direito à letargia, senão o poder-dever de acionar os mecanismos de controle interno legalmente previstos, a fim de buscar interromper a ação criminosa – ou, se já consumada, refrear a propagação de seus efeitos -, de um lado, e de “tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados”, de outro”, ressaltou a ministra em despacho nesta terça-feira, 29.

    Nessa linha, Rosa considerou “inviável” acolher o parecer de Aras, favorável a Bolsonaro, e mandou os autos da investigação de volta para a Procuradoria-Geral da República, “para as providências que reputar cabíveis”.

    Em despacho de 18 páginas, a ministra detalhou e rebateu os argumentos apresentados pela PGR no pedido de arquivamento do inquérito contra Bolsonaro. Segundo Rosa, a “compreensão” do Ministério Público Federal era a de que o presidente da República estaria autorizado “a permanecer inerte mesmo se formalmente comunicada da existência de crimes funcionais em pleno curso de execução nas dependências da estrutura orgânica do primeiro escalação governamental”.

    A ministra destacou que tal tese “não se sustenta”, destacando que o crime de prevaricação estabelece uma “competência administrativa” a ser exercida pelo Chefe de Governo. O delito é descrito no Código Penal como “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.

    Segundo Rosa, o dispositivo tipifica o “gesto de infidelidade aos deveres do cargo e à função pública na qual investido o agente, cuja ação, animada por interesses subalternos (“satisfazer interesse ou sentimento pessoal”), culmina por prejudicar o normal e regular desenvolvimento da atividade administrativa do Estado”.

    Nessa linha, a relatora da investigação destacou que o Presidente da República “é súdito das leis e não pode se furtar ao dever tanto de extirpar do sistema jurídico aqueles atos infralegais que se põem em antítese com as leis da República quanto de repreender, no plano disciplinar, os agentes do executivo transgressores do ordenamento jurídico”.

    “Esses são, portanto, os atos de ofício reclamados, no contexto acima descrito, do Chefe de Governo. Retardá-los ou omiti-los, injustificadamente, “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, constitui, sim, conduta apta a preencher o suporte fático da cláusula de incriminação prevista no art. 319 do CP (crime de prevaricação)”, ressaltou.

    Rosa ainda rebateu, de antemão, possíveis alegações de ofensa à independência funcional do Ministério Público – o órgão que é “titular da ação penal” – destacando que não queria compelir o MPF a “agir em tal ou qual direção”, mas apenas estava afastando a justificativa usada pela PGR na tentativa de isentar o presidente Jair Bolsonaro do crime de prevaricação.

    A ministra destacou que o acolhimento do pedido de Aras, nos termos em que foi feito, imprimiria “força persuasiva” à tese do PGR sobre o crime de prevaricação “com inevitáveis repercussões sistêmicas sobre as demais estruturas orgânicas do Poder Judiciário” e possíveis impactos nos âmbitos estaduais e municipais.

    Rosa frisou que cabe ao Supremo a “última palavra sobre o conteúdo normativo dos preceitos primários de incriminação”, ainda mais quando há discussão sobre o significado e alcance de dispositivos constitucionais, como os invocados pela PGR para “inibir” a caracterização do crime de prevaricação.

    “Ora, se o Procurador-Geral da República for o único juiz de suas próprias postulações, de forma que a leitura normativa por ele proposta, no âmbito de uma causa penal, deva ser considerada vinculante para as demais instituições do sistema justiça, inclusive e sobretudo para esta Suprema Corte, haverá nítida inversão – desautorizada pela Carta da República – do arquétipo constitucional de divisão funcional do Poder”, ressaltou a ministra.

    O inquérito que Rosa devolveu ao PGR apura se o chefe do Executivo cometeu crime de prevaricação por não ter alertado os órgãos de investigação sobre indícios de corrupção nas negociações para compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde. A investigação foi aberta na esteira da CPI da Covid, após notícia-crime oferecida pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO).

    O caso foi levado ao STF depois que o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão do parlamentar, Luis Ricardo Miranda, que é servidor do Ministério da Saúde, disseram em depoimento à comissão parlamentar que o presidente ignorou alertas a respeito de suspeitas de corrupção no processo de aquisição do imunizante fabricado pelo laboratório Bharat Biotech.

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