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  • 10/10/2017 08:11

    O Congresso insiste em cavar além do fundo do poço. É a tragédia de sempre. Com grande parte de seus membros acusados de corrupção, com base em provas cabais, e com o mais baixo nível de credibilidade perante a opinião pública, “suas excelências”, sem a menor cerimônia, aprovaram censura prévia aos meios de comunicação e às redes sociais. Agrediram a Constituição e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que não admitem restrições à liberdade de informação e comunicação. Em texto confuso, que dá margem a interpretações subjetivas, não tiveram sequer o cuidado de observar princípios elementares que orientam a elaboração legislativa. Ao contrário da clareza, objetividade, concisão e precisão, dentre outros, primaram pela inexatidão de uma norma ambígua.

    Em boa hora vetado pelo presidente, o dispositivo legal dizia que seria possível suspender “o discurso de ódio” e a "disseminação de informações falsas ou ofensas em desfavor de partido ou candidato”, mesmo sem amparo em decisão judicial. O que seria o discurso do ódio ou a disseminação de informações falsas ou ofensas em desfavor de candidato ou partido? Evidente que, numa avaliação subjetiva, pode ser o que venha a entender o interessado ou denunciante. Há exemplos correntes de investigados nos escândalos da Lava-Jato que juram inocência de pés juntos e negam qualquer envolvimento com os crimes de que são acusados, com incômoda insistência e cínica expressividade. 

    Insisto no tema porque o veto ainda será apreciado pelo Congresso e não será surpresa se “suas excelências” tentarem derrubar a objeção presidencial. Portanto, todo cuidado é pouco. Teve-se uma norma produzida sob encomenda e inserta à sorrelfa, com o indisfarçável propósito de evitar que a verdade sobre partidos e candidatos tenha curso na mídia e largo alcance nas várias formas de divulgação pela rede de computadores. Com a sucessão de delitos cometidos pelos políticos e suas legendas, cumpre conter a informação a qualquer preço, como alternativa capaz de livrá-los da cassação nas urnas democráticas. Com um ou outro deslize, a população não vota mal. Via de regra, é desinformada, ludibriada, uma vez que nunca lhe chega um retrato fiel dos candidatos, que conseguem esconder sua história pessoal, biografia política e reais intenções, fatos que lhes permite vender gato por lebre. Devidamente cientes, os eleitores tenderão a ser mais seletivos, até mesmo usando a opção do voto nulo, branco ou do não comparecimento às cabines de votação, como tem ocorrido em números crescentes nas mais recentes eleições no país.

    Como se não bastasse, num arremedo de reforma política, instituíram um fundão para financiamento de suas campanhas de quase R$ 2 bilhões, com recursos da União, retirados dos cofres da Viúva, ainda que mascarados sob diversas formas. Assim, como sempre, a conta será mais uma vez paga pelos escorchados contribuintes, que bancarão a ascensão e a carreira política de “suas excelências”. Receberão seus mandatos de mão beijada e, com a maior desfaçatez do mundo, ainda denominaram a iniciativa de "fundo de financiamento da democracia”. 

    É muita cara de pau. Bem, num Congresso constituído por Renan Calheiros, Jader Barbalho, Romero Jucá, Gleisi Hofmann e caterva, tudo é possível. Com essa trupe sob a mira da Lava-Jato e de outras operações paralelas de saneamento moral, estaremos sempre expostos a armações de igual natureza, em ações de preservação da espécie. Aonde ainda chegaremos?

    paulofigueiredo@uol.com.br

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