• Chuva em Petrópolis atingiu Casa da Princesa Isabel e residência de veraneio presidencial

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  • 19/02/2022 14:00
    Por Priscila Mengue / Estadão

    O impacto da chuva intensa e dos deslizamentos nos cerca de mil imóveis tombados na esfera federal de Petrópolis ainda é desconhecido. O centro histórico da chamada “Cidade Imperial”, destino de veraneio da monarquia e de presidentes da República, foi coberto de lama na terça-feira, 15, atingindo bens históricos, com a derrubada de uma grade da antiga Casa da Princesa Isabel e alagamento do térreo do Palácio Rio Negro, por exemplo.

    Não há até o momento registros oficiais de grandes danos estruturais. A tragédia é uma das maiores da cidade fluminense, que registrou mais de uma centena de mortos e segue com as buscas por desaparecidos. Funcionários de museus e outras instituições que funcionavam nos espaços foram impactados de diferentes formas, com a perda de familiares e das residências.

    O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou que realiza vistorias. “Teremos informações mais precisas nos próximos dias e semanas”, apontou em nota, na qual destaca que o foco principal do poder público é de buscas por vítimas, apoio aos desabrigados e desalojados e identificação de áreas de maior risco.

    “As vistorias já promovidas não foram conclusivas, devido à dificuldade de locomoção e ao grande número de destroços e lama na rua”, continua. “A situação pode ser agravada pelas chuvas previstas para os próximos dias, portanto, a real dimensão do impacto ao Patrimônio Cultural da cidade só poderá ser aferida após a conclusão desses trabalhos.”

    O termo “museu a céu aberto” é utilizado para descrever a cidade. Em comunicado anterior, a autarquia federal havia informado que o escritório técnico que mantém na região (em um anexo do Palácio Rio Negro) “não tem condições de funcionar presencialmente”, sem informar os danos. No sábado, 12, já havia divulgado não estar com uma linha telefônica operante, também por causa das chuvas.

    “Herdeiro das terras adquiridas pelo pai, Dom Pedro II promoveu a urbanização da cidade e a transformou na sede da corte imperial nas temporadas de veraneio. Com extensas áreas protegidas a nível federal, Petrópolis reúne história, paisagismo e excelência arquitetônica, constituindo um dos principais marcos do Patrimônio Cultural Brasileiro”, destacou o instituto.

    A grade e um muro da antiga Casa da Princesa Isabel foram derrubados durante a chuva. Danos internos no local ainda não foram informados pelos responsáveis, herdeiros da antiga família imperial, que mantém no local a Casa Imobiliária Petrópolis e estava com uma exposição com esculturas em papel machê.

    A antiga residência foi comprada pela princesa e o Conde D’Eu em 1876 do Barão do Pilar, membro da primeira diretoria do Banco do Brasil. Nas escadarias da varanda, foi feita uma das últimas fotografias de D. Pedro II e a da família em terras brasileiras, dias antes da Proclamação da República.

    No Museu Palácio Rio Negro, o piso térreo foi inundado por causa do transbordamento de um rio nas proximidades. Além disso, deslizamentos atingiram uma parte do terreno, mas não chegaram até a edificação principal, segundo o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), responsável pelo espaço. Parte dos servidores ficou ilhada e teve de passar a noite no piso superior do local.

    O palácio está em um complexo que inclui ainda um chalé, o Palacete Raul de Carvalho e a Casa das Guardas, sede do escritório do Iphan na região serrana, dentre outras construções. O palácio foi morada do Barão do Rio Negro, residência de verão de presidentes da República, sede do governo fluminense e da Brigada da Infantaria.

    Com a obra projetada pelo engenheiro italiano Antonio Jannuzzi, o palácio tem estilo eclético e foi entregue no fim do século 19. Em 1896, foi comprado pelo governante do Rio, Joaquim Maurício de Abreu, para ser a sede do governo estadual, função que exerceu até 1903, ainda segundo o Ibram.

    Na sequência, tornou-se residência de verão da presidência da República, na qual se hospedaram chefes de Estado de diferentes períodos históricos, como Rodrigues Alves, Nilo Peçanha, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, João Goulart, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.

    Em nota, a Prefeitura de Petrópolis aponta que “ainda está fazendo esse levantamento” sobre o impacto nos imóveis históricos. “As equipes da Defesa Civil contabilizam 553 ocorrências desde a última terça-feira, dessas 436 são por deslizamentos, 29 alagamentos e 88 avaliações de riscos.”

    Imagens feitas por moradores com drone mostram o terreno do Palácio de Cristal coberto de lama. Montado com estrutura desenvolvida na França e encomendado pelo Conde D’Eu, marido da Princesa Isabel, foi inaugurado em 1884. Hoje, pertence à Prefeitura e está fechado há mais de dois anos, à espera da conclusão do restauro.

    Já o Museu Imperial divulgou que a edificação principal não foi afetada pela chuva e que o acervo permanece preservado, durante a qual visitantes e funcionários tiveram de se abrigar no local até a manhã seguinte. Segundo a instituição, duas construções do complexo (refeitório, no qual houve o rompimento de vidraças, e vestiário de funcionários) estão “comprometidas” por causa de um deslizamento em terreno anexo. “Ambos foram interditados por medidas de segurança.”

    Além disso, o museu informou que os fundos do Pavilhão das Viaturas foram atingidos, mas que “não houve danos”. A visitação ao local segue suspensa por tempo indeterminado. “A Defesa Civil foi acionada para avaliar todas as estruturas e edificações do complexo.”

    Ele é sediado no antigo Palácio Imperial, construído por determinação de D. Pedro II, em 1945, cuja obra levou 10 anos. Com estilo neoclássico, foi uma das residências favoritas do imperador.

    Em rede social, o Museu Casa do Colono informou não ter sofrido danos. “O acervo encontra-se preservado e os servidores estão em segurança”, apontou. O espaço está fechado para visitação por tempo indeterminado. “Infelizmente, ruas próximas do Museu Casa do Colono estão comprometidas em decorrência de alagamentos e deslizamentos no bairro Castelânea.”

    Além da catedral, o Theatro D. Pedro também passava por trabalhos de restauro, com previsão de entrega no primeiro quadrimestre de 2022. O imóvel tem arquitetura eclético, com influências do art-déco e foi inaugurado em 1933.

    Em nota, a Fiocruz informou que o Palácio Itaboraí (de 1892, que sedia atividades da fundação) não sofreu danos nas “estruturas que compõem o patrimônio histórico”. “No entanto, por conta da dificuldade de mobilidade urbana e atendendo aos pedidos da Prefeitura Municipal e da Defesa”, destacou.

    ‘Cidade Imperial’ manteve prestígio na república

    O centro histórico de Petrópolis é um dos oito “conjuntos urbanos” tombados pelo Iphan no Rio de Janeiro. O reconhecimento ocorreu primeiramente no eixo da Avenida Köeler (que até hoje concentra o patrimônio mais preservado e fica nas proximidades do leito do Rio Quitandinha), em 1964, e, nos anos 1980, foi estendido a outras edificações.

    Segundo o Iphan, o conjunto reúne imóveis da segunda metade do século 19 e do início do século 20, com estilos variados, como neoclássico final, romântico (chalés) e eclético. O tombamento inclui as Avenidas Sete de Setembro, Tiradentes e Ipiranga, as Ruas São Pedro de Alcântara e Raul de Leoni, a Praça Visconde de Mauá, a Catedral de São Pedro de Alcântara e diversas casas.

    Entre os bens tombados pelo Iphan, destacam-se ainda a Catedral São Pedro de Alcântara, a Casa de Santos Dumont, o acervo do Museu de Armas Ferreira da Cunha), as casas do padre Correia (Fazenda da Posse),a Fazenda Samambaia, da Fazenda Santo Antônio, o retábulo e imagem de Nossa Senhora do Amor Divino da Igreja Matriz de Correias.

    Determinada em decreto imperial assinado por D. Pedro II em 1843, a fundação de Petrópolis ocorreu algumas décadas após a passagem de D. Pedro I pela região durante uma viagem, após a qual comprou terras no entorno. A determinação previa a construção do futuro Palácio Imperial, a urbanização do que seria a Vila Imperial (centro histórico) e a obra da catedral e de um cemitério.

    A cidade manteve o prestígio mesmo após a Proclamação da República, sendo. Há mais de 100 anos, foi a residência de aristocratas e figuras de destaque nacional, como a artista e primeira-dama do País Nair de Teffé e do jurista Rui Barbosa.

    Além dos imóveis tombados, o município tem ao menos sete sítios arqueológicos históricos cadastrados no Iphan: Sítio Histórico Paulo Hungria Machado, Fazenda Branca I e II, Sítio do Engenho, Sítio do Vané e Pantanal I e I. Nos locais, foram encontrados materiais variados, como louças, fornos e estruturas de construções.

    Em janeiro, as intensas chuvas que atingiram Minas Gerais causaram o desmoronamento de dois casarões históricos em Ouro Preto, parte do conjunto considerado patrimônio mundial pela Unesco. Imagens esculpidas por Aleijadinho também foram afetadas em uma das seis capelas do Santuário do Bom Jesus de Matozinhos, em Congonhas.

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