Conselheiro afastado do TCE-SP por mais de 7 anos recebeu R$ 3 mi em salários
Mesmo afastado das funções desde agosto de 2014 por determinação judicial – em meio a investigações do Ministério Público que lhe atribuem supostos atos de corrupção, recebimento de propinas e titularidade de conta secreta na Suíça com saldo superior a US$ 3 milhões -, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, Robson Riedel Marinho, foi contemplado regularmente com vencimentos do cargo. Em dezembro passado, o valor bruto da remuneração de Marinho foi de R$ 35.462,22.
Marinho continuou recebendo vencimentos amparado na mesma decisão que o alijou da Corte de Contas. No despacho dado em 2014, a juíza Maria Gabriela Pavlópoulos Spaolonzi, da 13ª Vara da Fazenda Pública da Capital, registrou expressamente que o afastamento não implicava no bloqueio do contracheque do conselheiro. Assim, mesmo fora de qualquer atividade no TCE ele recebeu seus proventos nesses 88 meses.
Mesmo sem despachar um único ato formal, dados do TCE indicam que Marinho ganhou também o 13º salário, além de valores relativos ao abono permanência – benefício que não se não se restringe ao teto remuneratório previsto na Constituição e é concedido ao servidor efetivo que completar os requisitos para aposentadoria voluntária. Em seu lugar, nesses sete anos e quatro meses de ausência do conselheiro vitalício, revezaram-se auditores da Corte de Contas no gabinete e nas sessões de Turma e plenárias.
Segundo o portal da Transparência do TCE-SP, a remuneração líquida de Marinho em dezembro foi de R$ 24.276,26, após seu subsídio sofrer descontos não detalhados, mas que incluem pagamentos ao Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de S. Paulo (IAMSPE), à Previdência e ao Imposto de Renda. Além do montante, é registrado o pagamento de R$ 5.853,25 de abono ao conselheiro. O 13º salário ficou em R$ 37.850,97 (bruto) e R$ 24.286,68 após os descontos. O abono relativo ao mesmo foi de R$ 5.842,83, e há registro ainda de recebimento de R$ 2.388,75 ligados a ‘outras verbas remuneratórias, legais ou judiciais’, também sem especificações quanto ao caso de Marinho.
Considerando valor bruto do subsídio pago ao conselheiro, de R$ 35,4 mil, e os 88 meses que ele esteve afastado das funções corte de contas paulista (entre agosto de 2014 e dezembro de 2021), chega-se no valor, sem correção monetária, de R$ 3,1 milhões. Pensando ainda no pagamento do 13º salário nos oitos anos em que a ordem judicial de afastamento vigorou, o montante recebido pelo membro do TCE-SP chega a quase R$ 3,38 milhões.
A conta tem por referência os valores brutos disponíveis no site do próprio TCE relativos ao mês de dezembro de 2021. O site do Tribunal não disponibiliza os dados dos pagamentos além daqueles relativos ao mês anterior à consulta, no caso, dezembro.
Além dos proventos recebidos por parte do TCE, Marinho recebe uma pensão parlamentar de R$ 12,6 mil (valor bruto), segundo o portal da transparência estadual.
Nesta terça-feira, 18, ato da presidente do Tribunal de Contas, Cristiana de Castro Moraes, cessou efeitos da convocação do auditor Márcio Martins de Camargo, abrindo caminho para Robson Marinho reassumir as funções de conselheiro. A presidente se baseou na decisão do juízo da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo que decretou declarou a extinção da punibilidade, por força de prescrição, dos crimes imputados a Marinho, que foi formalmente denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção e lavagem de dinheiro.
O afastamento de Marinho da corte de contas paulista foi decretado em 2014 pela Maria Gabriela Pavlópoulos Spaolonzi, da 13.ª Vara da Fazenda Pública da Capital. A decisão se deu no âmbito de uma ação por improbidade administrativa a que o conselheiro ainda responde, e está em encerramento da fase de instrução. Na ocasião, a medida foi imposta sem prejuízo à remuneração de Marinho.
O órgão imputa a Marinho enriquecimento ilícito, sustenta que ele lavou dinheiro no exterior e afirma que o conselheiro de contas participou de um “esquema de ladroagem de dinheiro público”. Segundo a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, braço do Ministério Público estadual que investiga improbidade e corrupção, mesmo de volta às funções no TCE, Marinho continua com os US$ 3 milhões bloqueados na Suíça e com bens bloqueados em São Paulo no âmbito de tal processo que segue em curso contra ele. A ação está no encerramento da fase de instrução.
Em setembro de 2017, a 12ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo chegou a acolher recurso de Marinho na ação de improbidade e decidiu reintegrar o conselheiro. A procuradora que atuava no caso junto ao Tribunal de Justiça não recorreu da decisão.
No mês seguinte, o afastamento do conselheiro da corte de contas paulista foi restabelecido, quando o Superior Tribunal de Justiça aceitou denúncia contra Marinho, o colocando no banco dos réus por supostos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro ocorridos entre 1998 e 2005. Ele foi secretário da Casa Civil do Estado de São Paulo (1995/1997), no governo Mário Covas (PSDB), e conselheiro do TCE desde abril de 1997.
A Procuradoria sustentava que Marinho favoreceu a Alstom no âmbito do aditivo do projeto Gisel, empreendimento da Eletropaulo, antiga estatal de energia, para expansão do Metrô. Ainda segundo o MPF, Marinho teria recebido propina de US$ 3 milhões da multinacional francesa por meio da offshore Higgins Finance Ltd, nas Ilhas Virgens. A conta Higgins, cujo beneficiário seria do conselheiro. Foi aberta no Crerdit Suísse, de Genebra, em 1998.
Em 2018, a ação contra o conselheiro foi remetida pela ministra Nancy Andrighi, STJ, ao juízo da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, em razão da decisão do Supremo Tribunal Federal que restringiu o foro por prerrogativa de função. No mesmo ano, o TCE-SP arquivou processo administrativo contra o conselheiro.
Em dezembro, o juízo da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo declarou a extinção da punibilidade, por força de prescrição, dos crimes imputados a Marinho. O despacho ressaltou que os crimes narrados na denúncia do Ministério Público Federal teriam ocorrido entre 1998 e 2005. Assim, o prazo prescricional dos delitos foi calculado considerando que o conselheiro já completou 70 anos – o que faz com que tal prazo seja reduzido pela metade.
‘Compromisso de zelar pela coisa pública’
Após a notícia de seu retorno ao TCE-SP começar a circular, Marinho ressaltou, em nota, o ‘desgaste pessoal’ que sofreu no ‘enfrentamento das muitas idas e vindas do longo processo judicial”. O conselheiro ainda disse “reafirmar o compromisso de bem zelar pela coisa pública”.
O conselheiro ainda questionou aspectos da denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, alegando que o contrato Gisel e o aditivo – que, segundo a Procuradoria, estariam ligados às propinas supostamente pagas ao conselheiro – ‘nunca foram apreciados pelo Tribunal de Contas.
Ainda segundo o magistrado, a corte de contas aprovou ‘apenas’ um contrato de extensão da garantia, com a Alstom no Brasil, ‘que se destinava também ao transporte dos equipamentos desde a França, a guarda e sua manutenção’.
“A cronologia e a lógica dos fatos desmentem essa acusação, pois o suposto pagamento teria ocorrido em 1998, mas o contrato de interesse da Alstom, que eu relatei, só chegou ao Tribunal em 2011. Então, teria havido pagamento de propina três antes de o fato acontecer”, afirmou.
COM A PALAVRA, O CONSELHEIRO ROBSON MARINHO
A reportagem entrou em contato com assessoria de imprensa do TCE-SP, que informou ter encaminhado o pedido de posicionamento sobre tema ao gabinete de Marinho. O espaço está aberto para manifestações.