“Sua Excelência, o fato”
Ulysses Guimarães dizia que De Gaulle chamava o Fato de Sua Excelência. Assim, com maiúscula, capaz de sobrepor-se a tudo, segundo o velho timoneiro da luta pela liberdade no Brasil, durante o período negro do golpe militar de 1964. Seguia na mesma linha do antigo brocardo popular de que contra fatos não há argumentos, convicto de que “hechos son los hechos”, como a firmam os espanhóis.
É o que se ouve nas gravações do negocista Joesley Batista do encontro que teve com o presidente da República. Onde estão os fatos, certos, indesmentíveis? Sem dúvida, ocorrem a partir da reunião de Temer com Joesley, na calada da noite e nos porões do Palácio do Jaburu. A propósito, para ingressar na residência presidencial o dono da JBS usou o nome de Rodrigo Rocha Loures, homem de confiança, copa e cozinha de Temer, a quem mais tarde entregaria uma mala contendo R$ 500 mil. Em seguida, acontecem nos diálogos travados entre ambos, confirmados pelo presidente, com insignificantes divergência s sequenciais.
A conversa estarrece e agride a Nação, vazada em expressões condenáveis. Resulta evidente a compra do silêncio de Eduardo Cunha, ainda que negado pelo próprio, com pagamento de mesadas generosas ao preso de Curitiba. Há notícias sobre o controle remunerado de um procurador da República, já preso, que passava informações permanentes e sigilosas aos delinquentes. Na sequência, um rosário de queixas contra a direção do BNDES, do Cade – Conselho Administrativo de Defesa Econômica, do Ministério da Fazenda e de outros órgão públicos, que vinham opondo entraves às investidas criminosas das empresas dos irmãos Batistas. No colóquio de submundo, críticas indiretas de Temer levariam à exoneração de Maria Silvia Bastos Marques, presidente do Banco, competente e séria, uma grande perda para o governo e para o Brasil.
Ainda mais grave foi a nomeação do deputado federal Rodrigo Rocha Loures, como representante do presidente, com carta branca para fazer e acontecer em seu governo, em atenção aos pedidos e interesses da JBS. Como ex-assessor direto e íntimo de Temer, feito deputado federal de encomenda, mais uma vez mantido na função parlamentar, com a remoção de Osmar Serraglio para o Ministério da Transparência, ficou credenciado para resolver TUDO, segundo os diálogos do Jaburu. Antes, em telefonema devidamente gravado e dado a público, Loures agendou e combinou os termos do encontro de Joesley com o presidente.
Temer, além de autorizar e credenciar Loures como seu ‘longa manus’, aprova os atos que lhe foram relatados por Joesley, com palavras induvidosas. Portanto, como fatos são fatos, espelhos da realidade, negar o quê?
Sem alternativa, o presidente insiste em manter-se no cargo. Não abre mão da Presidência e faz de conta que não alcança a real dimensão da crise. Manobra, como acaba de fazer com a nomeação de Torquato Jardim para o Ministério da Justiça, em consideração a seus contatos junto ao Poder Judiciário. E vai tocando, como avestruz, na condição vexatória de ser o presidente mais impopular da história, em situação que o aconselharia a renunciar. Com Temer as reformas trabalhista e previdenciária naufragarão e o mercado continuará ladeira abaixo, com & iacute;ndices negativos que se projetarão sobre o conjunto da economia. O presidente logo perderá o que lhe resta de apoio parlamentar, com a base de sustentação do governo já fraturada. Resiste, sem o menor espírito público e sem pensar no Brasil, até quando?
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