• Sem estrutura para levar gás natural a usinas, Brasil eleva importação do insumo

  • 05/06/2021 07:23
    Por Fernanda Nunes / Estadão

    Neste período de seca nos reservatórios das hidrelétricas e de uma iminente crise hídrica causada pelo baixo volume de chuvas, o País deixa de aproveitar mais da metade de todo o gás natural que produz e que poderia estar sendo usado para gerar energia térmica. Ao mesmo tempo, aumentam a importação e o custo para trazer o produto de fora. Neste ano, as compras externas de gás natural pelo Brasil atingiram o maior patamar desde 2016 para os meses de janeiro a abril. Apenas em quatro meses, o País pagou US$ 1 bilhão, quase o total gasto em todo o ano passado e o dobro do valor pago no mesmo período de 2020.

    Essa alta nas importações deve chegar à conta de luz, já que as usinas termoelétricas são as substitutas naturais das hidrelétricas em períodos de seca e vão ser acionadas para evitar a repetição do apagão de 2001.

    Em vez de ser usado como insumo para a geração de energia térmica, o gás nacional está sendo injetado de volta nos campos marítimos, sobretudo nos do pré-sal. De janeiro a abril, o volume de gás nacional distribuído ao mercado já caiu 14%. Esse é o dado mais recente divulgado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Ao mesmo tempo, cresce a importação da matéria-prima, cobrada em dólar e a preço internacional.

    Dos 131,4 milhões de metros cúbicos por dia de gás extraídos no País, apenas 53,5 milhões são ofertados para venda. Isso significa que 60% do total não chegam ao mercado. Essa tem sido a tônica desde que o pré-sal ganhou relevância, porque falta infraestrutura para escoar toda a produção dos campos.

    O governo federal editou na quarta-feira um decreto que regulamenta a Nova Lei do Gás, sancionada em abril e que visa a modernizar o setor. A ideia é criar um mercado “aberto, dinâmico e competitivo”, segundo a Secretaria-Geral da Presidência da República.

    O gás natural é o principal insumo usado na geração de energia térmica, que ganhou importância neste período de crise hídrica. Em 31 de maio, essas usinas bateram recorde de geração, de 17,13 mil megawatts médios (MWmed) por usina, segundo o Operador Nacional do Sistema (ONS). A consequência direta é o aumento do preço da energia, já que esse tipo de geração é mais caro do que a hidrelétrica. Numa indicação ao consumidor de que a conta de luz vai ficar mais cara, o governo acionou, no fim de maio, a bandeira vermelha 2.

    Indexador

    O aumento da demanda térmica está sendo suprido, em grande parte, pelo gás importado, cobrado em dólar. A mesma lógica vale para o produto nacional, já que, no cálculo do seu preço, são utilizadas as mesmas variáveis do produto importado. Esse modelo de negócio, no entanto, começa a ser questionado por especialistas, uma vez que, nesses parâmetros, pouca diferença faz entre aumentar a produção interna ou a importação. O custo do insumo e o peso na conta de luz acabam sendo os mesmos.

    Na tentativa de melhorar as condições de compra para seus clientes, a Petrobrás recentemente anunciou a possibilidade de indexar o gás fornecido por ela ao gás Henry Hub (HH), ofertado em um mercado de produtores americanos. Seria uma alternativa aos contratos indexados ao petróleo do tipo Brent, na Bolsa de Londres.

    Os preços do gás Henry Hub têm sido os mais baixos do mercado internacional nos últimos 11 anos, segundo Ieda Gomes, ex-presidente no Brasil da empresa de energia BP, membro de conselhos de administração de empresas do setor e especialista no tema.

    Durante o evento virtual Gas Week, promovido pela agência especializada EPBR no fim de maio, ela apresentou dados sobre os dois indexadores. Em 12 meses até maio deste ano, o HH subiu 71%, enquanto o petróleo do tipo Brent variou 105%.

    Ela destacou, no entanto, que “uma coisa é o preço e outra, o índice de reajuste”. O fato de o Henry Hub ser barato não significa que o gás brasileiro vai estar no mesmo nível. Mas, se for indexado ao HH, a expectativa é de menos volatilidade. “Por que não pensar numa indexação de uma fatia do gás ao IGP-M? O preço ofertado ao mercado doméstico vai ser indexado ao dólar? Se for, não poderá fugir da depreciação do real frente à moeda americana”, disse. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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