• Sem penhor, brasileiro vende as joias

  • 02/05/2021 16:00
    Por Márcia De Chiara / Estadão

    Uma das linhas de crédito mais baratas do mercado, com juros de 1,99%, e sem burocracia, o penhor sempre foi visto por muitos brasileiros como alternativa para enfrentar imprevistos na administração do orçamento doméstico. Mas nos últimos meses isso deixou de ser verdade para pelo menos parte dos usuários do sistema.

    Na semana passada, o Estadão entrou em contato com várias agências na capital paulista da Caixa – que detém o monopólio no setor – e foi informado que o serviço estava suspenso para novas operações. Segundo a reportagem apurou, em meio à pandemia o penhor foi considerado como serviço não essencial em comunicado emitido pela instituição em março do ano passado e, portanto, foi interrompido para novas operações.

    O penhor é uma linha de crédito na qual a pessoa deixa objetos de valor, como joias, relógios e pratarias como garantia em troca de dinheiro vivo. O interessado pode estar na lista de inadimplentes, até da própria Caixa, que não encontra obstáculos.

    Por meio de sua assessoria de imprensa, a Caixa, porém, não confirma que o serviço tenha sido suspenso para novas contratações. Em comunicado, informa que, “em virtude da pandemia, algumas dessas unidades (465) estão ofertando somente o serviço de renovação”. Ainda de acordo com a instituição, em março foram realizados 22,6 mil novos contratos de penhor e 441,1 mil renovações. Em abril, até o dia 23, tinham sido fechados 13 mil novos contratos e 295,4 mil renovações.

    Questionada pela reportagem, a Caixa não informa o saldo das operações de penhor. Na apresentação mais recente de resultados do banco, relativa ao último trimestre de 2020, também não há uma rubrica específica para o penhor. Mas a reportagem apurou que o penhor é o terceiro produto em rentabilidade.

    Dom Pedro

    Fonte de recursos imediatos a custos mais baixos, o penhor também é uma das linhas de crédito mais antigas na praça e está ligada às origens da Caixa. Criada pelo decreto 2.723, assinado por Dom Pedro II em 1861, a instituição tinha a função de guardar “as pequenas economias das classes menos abastadas” e “emprestar, por módico juro e sob penhor, as somas necessárias para socorrer as urgentes necessidades das classes menos favorecidas”, como consta na história da instituição.

    Entre abril e setembro do ano passado, a publicitária “A”, que conversou com o Estadão sob condição de anonimato, foi várias vezes à agência da Caixa perto da sua casa na capital paulista, mas perdeu todas as viagens. Desempregada e inadimplente, ela ficou sem alternativa. Em setembro último, acabou tendo de vender as joias de família para conseguir pagar as despesas do dia a dia. “Eu não queria vender, agora vendi, acabou”, contou a publicitária.

    Com a venda de um solitário de brilhante, um par de brincos de argola de ouro e um escapulário de ouro branco no mercado informal, ela conseguiu arrecadar R$ 4 mil. Foram R$ 500 a mais do que o oferecido por lojas especializadas na compra de joias de segunda mão e R$ 1 mil acima do crédito que ela calcula que conseguiria na Caixa.

    De toda forma, a publicitária lamenta a venda e a falta de opção, no momento, por não conseguir fechar novos contratos de penhora.

    Assídua do penhor, a publicitária lembra das cenas de alegria que presenciou no passado, de outras pessoas e dela própria, quando conseguiam recuperar os bens penhorados. “Fico triste porque, quando você vende uma joia de família, que tem uma ligação emocional, é sinônimo de fracasso. Já no penhor, a situação é transitória e há a chance de se reaver o bem.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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