• Aos 14 anos, Sofia recoloca sobrenome Kano no cenário do tênis de mesa

  • 29/04/2021 18:00
    Por Alessandro Lucchetti, especial para a AE / Estadão

    Existem a hora do chá e a hora da Ave Maria. Na casa do acupunturista Mauro Kano, em São José dos Campos, ele sabe que, às 17h, é a hora em que tem de tirar o carro da garagem, forrar a grade do portão com um pano e montar a mesa para sua filha, Sofia, bater sua bolinha. Todos os dias, religiosamente, a atleta de 14 anos começa, nesse horário, a fazer seu aquecimento, e depois passa a treinar saques. Às 19h30, chega o treinador Waldemir da Silva Júnior, o Júnior. As raquetadas se estendem até as 22h. Treinar na garagem foi a solução encontrada para que a adolescente continue evoluindo enquanto o seu clube, em Jacareí, permanece fechado devido à pandemia.

    O esforço tem valido a pena. Em fevereiro, Sofia conquistou vaga para representar o Brasil no Campeonato Sul-Americano de Tênis de Mesa da categoria sub-15, que será disputado em Lima, no final de maio. É a volta do nome Kano ao cenário internacional do tênis de mesa.

    Com 12 medalhas, Claudio Kano era o maior colecionador brasileiro de peças, acumuladas ao longo de quatro participações nos Jogos Pan-Americanos (Caracas-83, Indianápolis-87, Havana-91 e Mar del Plata-95). Em 1996, um dia antes de embarcar para Atlanta, onde disputaria os Jogos Olímpicos pela terceira vez, o craque do tênis de mesa morreu, aos 30 anos de idade, em consequência de ferimentos sofridos num acidente de moto, na Marginal Pinheiros.

    Muitos anos depois, Pedro Kano, irmão de Sofia, começou a brincar de ping pong no intervalo das aulas, na escola, e passou a gostar. Então com 12 anos de idade, ele iniciou um treinamento sério, e hoje participa dos Jogos Regionais. “A Sofia tinha então seis anos de idade, e se interessou também”, conta Mauro. Os dois irmãos leram o livro “Claudio Kano – A trajetória de um campeão”, de Silvio Nascimento, e buscaram inspiração no famoso primo de segundo grau.

    Júnior, que chegou a jogar com Claudio, não vê muitas semelhanças entre o jogo de Claudio e o de Sofia. “O tênis de mesa evoluiu muito ao longo do tempo. É difícil comparar Pelé com Messi, para ficarmos num exemplo do futebol. O que vejo em comum entre eles é a dedicação, a disciplina. A Sofia tem o sonho olímpico, e treina diariamente em busca dele.”

    Além de manter uma rotina com cinco horas diárias de treinamento, a mesa-tenista capricha na alimentação balanceada, faz Pilates e osteopatia para manter o corpo bem equilibrado, longe de lesões.

    “Eu me inspiro na história do meu primo. Tenho a biografia dele e converso um pouco com os pais dele. Uma vez ele quebrou a perna jogando futebol e ficou sem poder competir, mas passou a treinar só saque, durante oito horas por dia, até se recuperar. Com isso ficou com o melhor saque do mundo”, disse Sofia, em entrevista para a assessoria de imprensa da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa em 2019, quando conquistou três medalhas de prata na Supercopa Brasil, em Cuiabá. Na capital mato-grossense, aliás, está localizado o Centro de Treinamento Claudio Kano.

    Sofia até sente um pouco de pressão por carregar um nome com tamanho significado na história de tênis brasileiro – mas não acha isso ruim. “Eu mesma pego essa inspiração e essa pressão para mim. Quero honrar esse nome.”

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