• Uso de bike cresce, mas máscara é raridade

  • 12/04/2021 13:00
    Por João Ker / Estadão

    O trânsito de ciclistas na cidade de São Paulo aumentou durante a pandemia, mas mesmo com o sistema hospitalar da capital próximo ao colapso, o uso de máscara ainda é uma raridade na ciclovia. Dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) mostram que o primeiro trimestre deste ano teve crescimento de 22,8% nas passagens de bicicleta em três das principais vias da cidade.

    Dois dos três pontos fixos de contagem da CET apontaram aumento nas passagens de bicicleta: nas avenidas Vergueiro e Gastão Vidigal, o movimento no primeiro trimestre aumentou 115,4% e 29%, respectivamente. A única que apresentou diminuição no mesmo período foi a Faria Lima, de 24%.

    De acordo com dados da Farah Service, que administra a Ciclovia Novo Rio Pinheiros, houve “aumento expressivo no fluxo de ciclistas”, que só neste primeiro trimestre já recebeu 230 mil acessos, o equivalente a 60% do total observado em todo o ano passado. Em nota, a empresa afirma que “os controladores de acesso, assim como seguranças e responsáveis, são orientados a solicitar o uso de máscaras” aos usuários, e que a mensagem é reforçada por placas nas entradas.

    Mas quem pedala pelas ruas da metrópole relata casos constantes de negligência e desrespeito às normas sanitárias.

    O professor brasiliense Yuri Vasquez, 33 anos, conta que, antes da pandemia, pedalar fazia parte de sua rotina diária, quando ele se deslocava de Santa Cecília, onde mora, até Santana, na zona norte, onde trabalhava. Agora, com o home office, Vasquez raramente tem subido na bike para pedalar.

    “Apesar de as bicicletas serem mais seguras do ponto de vista da covid, por não estarmos em um ônibus lotado e até aumentarmos a nossa resistência física, tenho visto grupos de pedal fazendo passeio noturno e usando a bike como lazer”, conta. “Isso acaba trazendo fator de risco para elas mesmas e para as outras pessoas. É inaceitável.”

    O comportamento também é observado por Emiliano Martins, engenheiro de 42 anos que também usava diariamente a bicicleta, mas agora só pedala três vezes por semana. A média de 100 a 200 quilômetros percorridos semanalmente diminuiu e agora está em cerca de 30 quilômetros. A falta de segurança na ciclovia, ele conta, é um dos motivos.

    “Não dá nem para passear e correr o risco de ser atropelado porque não tem vaga para atendimento no hospital”, aponta Martins, um dos coordenadores voluntários do programa Bike Anjos, que ensina pessoas a andarem de bicicleta na capital e está suspenso desde o ano passado.

    “Infelizmente, quando saio tenho visto gente sem máscara, com ela no queixo ou sem cobrir o nariz. Isso me assusta mesmo, ver tanta gente com o argumento de que é ruim pedalar com máscara. Lógico que é! Mas isso não é desculpa.”

    Na tarde do sábado retrasado a reportagem do Estadão esteve na Avenida Paulista, que integra uma das maiores e mais frequentadas ciclofaixas entre os 680 quilômetros de cobertura na capital. Por lá, a presença de ciclistas e pedestres sem máscara é contínua e inevitável, muitos deles passeando em duplas ou grupos.

    “Tenho parado de andar de bicicleta na ciclovia porque tem aumentado o fluxo de ciclistas, seja para deslocamento ou lazer. O problema principal é que todo mundo anda sem máscara, só três em cada dez usam”, desabafa Daniel Freitas. Aos 34 anos, ele já está há uma década trabalhando como ciclista-entregador, “com a caixa nas costas” pelas ruas de São Paulo.

    Ele conta que desde o início da pandemia tem reparado em “novatos” nas ciclofaixas, com bicicletas novas e o medo de se arriscarem no asfalto. “Às vezes aparece um trenzinho de dez ciclistas, todo mundo sem máscara e com camiseta igual. Parece até uma manifestação de quem é contra o isolamento.”

    Cuidados

    De acordo com a médica do esporte e presidente da Sociedade Paulista de Medicina Desportiva (SPAMDE), Ana Paula Simões, o uso de máscara durante a atividade física precisa ser monitorado com cuidado pela própria pessoa. “Quando começar a sentir muita palpitação e ficar cansado, dá uma parada, respira, pausa embaixo de uma árvore. Começou a sentir falta de ar, para.”

    A médica afirma que modelos “respiráveis”, com furinhos, ou as máscaras com respirador (círculos na lateral) ajudam melhor na respiração, mas reconhece que os modelos são mais caros.

    Rosana Richtmann, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, alerta que a disseminação de partículas de suor e saliva pode ser maior durante a prática de esportes. “Faz bem pro corpo e pra mente, desde que com segurança. Pela atividade física, você tem uma respiração mais forte e elimina mais partículas de suor e saliva, que vão mais longe, até cinco metros – alcançam mais do que se você estiver andando”.

    Rosana indica que algumas medidas a serem adotadas incluem escolher um horário com menos gente, manter o distanciamento e ir a locais com menos aglomerações.

    Eliseu Alves Waldman, epidemiologista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, aponta que, para quem sente falta de ar com a máscara, as cirúrgicas são a melhor indicação porque dificultam menos a respiração.

    “Ao ar livre, o risco ainda é bem diminuído, ao contrário das academias, por exemplo. Mas precisa manter uma certa distância das pessoas”, diz.

    Ritmo

    “Pisar mais leve” é a forma que Edivaldo Teixeira, de 34 anos, encontrou para contornar a falta de ar. Desde o ano passado, ele trabalha como operador logístico da Pedileve, uma empresa de e-commerce responsável também pela entrega das compras. Apesar de hoje não estar mais na função de entregador, ele continua usando a bicicleta como meio de transporte.

    “Eu mudei a forma como pedalava. No início, até tentei manter o ritmo com a máscara, mas acelero muito, com 10 minutos ela já estava encharcada e tampava a minha respiração”, explica. “Agora, eu peguei o norte das coisas e consigo fazer as coisas com máscara, desacelerei.”

    Novo normal

    Trabalhando como entregador de bicicleta para dois aplicativos desde o início da pandemia, Pedro Carvalho, de 29 anos, confessa que mesmo com os anos de prática na bike, ele sente dificuldade de respirar com a máscara.

    “O meu macete é colocar em cima do nariz e, se alguma pessoa chegar perto, eu abaixo”, conta. “Mas até hoje não encontrei nenhuma máscara que ajudasse na respiração, porque uso óculos e aí embaça tudo, fica pior. Os aplicativos só oferecem máscara simples, que nem dá pra prender na cabeça, só na orelha.”

    Especialistas consideram máscaras uma barreira efetiva contra a propagação do novo coronavírus. Desde maio do ano passado, o uso da máscara é considerado obrigatório no Estado em espaços abertos ao público e no interior de estabelecimentos essenciais.

    Dicas para pedalar na pandemia

    – Horários alternativos: Procure horários alternativos e lugares isolados, onde não há fluxo de pessoas; a máscara é um fator importante de proteção durante a pedalada.

    – Respirador: Dê preferência ao uso de máscaras de modelos com respirador na lateral e as chamadas “face shields”, de acrílico.

    – Ritmo do exercício: Respeite o seu corpo e não tente fazer uma sequência muito elevada de exercícios.

    – Condições ideais: Pedale mais devagar para não aumentar a frequência cardíaca e ficar ofegante. E evite pedalar durante o dia ou em altas temperaturas, quando o desgaste físico será mais intenso.

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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