• Estudo aponta aumento de mortes diárias em Curitiba até o fim do mês

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  • 10/03/2021 08:48
    Por Fábio Bispo, especial para o Estadão / Estadão

    Curitiba vai enfrentar uma nova onda da pandemia com um pico de mortes até quatro vezes maior que os registrados em 2020. O alerta é do mesmo grupo de pesquisadores que previu a segunda onda da pandemia em Manaus, entre dezembro do ano passado e janeiro deste ano. O estudo é assinado por especialistas das áreas de matemática, estatística, infectologia, imunologia e biologia, e utilizou o mesmo modelo aplicado na capital do Amazonas.

    A partir desta quarta-feira, 10, o Estado do Paraná, incluindo Curitiba, retoma as atividades após um “lockdown” de 12 dias. Na capital paranaense foi anunciado um novo decreto, com toque de recolher entre 20h e 5h. As atividades comerciais voltam a funcionar com restrição de horários. Bares, eventos e casas noturnas seguirão suspensos.

    Para os pesquisadores, as medidas não serão suficientes para evitar o avanço da doença conforme o modelo estatístico. As análises da evolução temporal das curvas epidemiológicas de casos expostos, infectados e recuperados apontam crescimento acelerado de mortes previstas para o fim de março e início de abril, com uma média diária entre 80 e 90 óbitos, podendo chegar a 100 mortes por dia. Os dados foram coletados desde o início da pandemia até o início de março deste ano.

    O estudo aponta que seriam necessários pelo menos mais 21 dias com uma restrição de circulação de pessoas superior a 90% para que as previsões do modelo não se confirmem. “Dada a situação que se projeta para Curitiba, recomendamos um lockdown por um período mínimo de 21 dias, com necessidade de prolongamento até 30 dias caso não haja recrudescimento acentuado do número de internações e casos”, alerta o pesquisador Lucas Ferrante, doutorando pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e um dos autores do estudo.

    O modelo ainda prevê que Curitiba poderá enfrentar uma quarta onda de covid-19 se as medidas de isolamento indicadas não ocorrerem acompanhadas de programa de imunização em massa. Um dos fatores para seguidos picos da doença é o potencial de propagação da variante P.1, e que teve origem na região Amazônica e registrada no município de Curitiba. A P.1 é duas vezes mais transmissível e a carga viral presente no organismo é cerca de dez vezes maior que a carga viral dos infectados pela linhagem que deu origem à pandemia, aponta o estudo.

    Os modelos SEIR (Susceptíveis, Expostos, Infectados e Recuperados) têm predito com precisão e antecedência o aumento de casos, internações, óbitos e a ocorrência de novas ondas para o Brasil, a exemplo da segunda onda prevista em Manaus.

    O estudo que previu o colapso em Manaus foi publicado em agosto de 2020 na revista científica Nature Medicine, e na época foi ignorado pelas autoridades. Em janeiro deste ano, o mesmo grupo anunciou uma terceira onda em Manaus, prevista para final de abril e início de maio, e novamente os indicativos de “lockdown” e vacinação em massa continuam ignorados.

    “Ignorar estes resultados têm representado um alto custo de perda de vidas. Curitiba está para retomar as aulas e isso também é um grande erro. A terrível experiência de Manaus deixa clara a inviabilidade de retorno presencial ou híbrida quando o município ainda está em estado de transmissão comunitária”, emenda Ferrante.

    Embora a maioria das vítimas fatais por covid sejam a de adultos, segundo relata o estudo, nas crianças a carga viral é equivalente aos adultos, os tornando transmissores de pais, avós, professores e funcionários. O retorno das atividades escolares potencializaria a contaminação de 500 mil pessoas, afirmam os pesquisadores.

    Na segunda-feira, 8, o município adiou o retorno às aulas para 6 de abril. Na rede particular, que segue as normas do Estado, o retorno será facultativo. Já nas escolas estaduais, o retorno presencial, em modelo híbrido, está previsto para o próximo dia 15 de março.

    Durante coletiva de imprensa na tarde desta terça-feira, para anunciar novo decreto que vai regrar o funcionamento das atividades a partir desta quarta-feira, 10, a secretária de Saúde do município, Márcia Huçulak, afirmou que Curitiba enfrenta o pior momento da pandemia.

    Márcia disse que mesmo em regime de “lockdown”, a circulação de pessoas não tem diminuído como esperado e que será preciso contar com a colaboração da população: “A sociedade precisa entender que é hora de ficar mais em casa, é hora de circular menos”, afirmou.

    “Várias atividades precisam ser mantidas, entendemos que a sociedade não pode parar de comer, o transporte precisa deslocar trabalhadores de saúde”, exemplificou a secretária sobre as medidas de restrições mantendo parte do comércio em funcionamento.

    Sobre o apontamento do estudo que prevê uma terceira onda com picos de mortes ainda maiores, o diretor do Centro de Epidemiologia do município, Alcides Oliveira, afirmou que Curitiba “já está vivenciando essa nova onda”.

    “As características estão sendo semelhantes em diferentes Estados. Essas medidas todas já foram desencadeadas para internamento e tratamento das pessoas. Agora há a necessidade da adesão e consciência da população”, declarou.

    UPAs vão virar hospital

    A partir desta quarta-feira, as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Curitiba funcionarão como hospitais, segundo antecipou a secretária municipal durante a coletiva. “Nossas UPAs se transformam a partir de amanhã em hospitais para atender covid. Apenas entrará nas UPAs pacientes graves encaminhados pelo Samu ou encaminhados pelas nossas unidades. Nossas UPAs têm respiradores e gases”, afirmou Márcia.

    Curitiba já registrou mais de 150 mil casos com 3.067 óbitos. A média é de mil novos casos por dia e 19 óbitos. Em todo o Estado, a fila por uma vaga de UTI ou em leitos de enfermaria passa de mil pessoas. O governo do Estado decidiu manter as diretrizes do novo decreto para abertura dos serviços não essenciais após 12 dias de “lockdown” a partir desta quarta-feira.

    O Sindicato dos Médicos do Estado do Paraná, Simepar, emitiu nota se posicionando de forma contrária à retomada das atividades não essenciais. “Economia se recupera, vidas não”, afirmou Marlus Volney de Morais, presidente Simepar.

    A nota da entidade da categoria médica fala em “efeito devastador” com a retomada da circulação de pessoas no comércio e demais atividades não essenciais. “Neste cenário, retomar as aulas presenciais e abrir o comércio não essencial terá um efeito devastador, aumentando ainda mais o número de mortos e fazendo com que muitas pessoas sequer recebam atendimento médico”, diz trecho da nota.

    O Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho, a Defensoria Pública da União e a Defensoria Pública Estadual enviaram ofício ao governador Ratinho Junior (PSD) pedindo que a decisão de retomar atividades não essenciais seja revista e o “lockdown” prorrogado.

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