• ‘Little Birds’ traz personagens femininas fortes em busca de sua sexualidade

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  • 16/02/2021 07:54
    Por Mariane Morisawa, especial para o Estadão / Estadão

    Alguém que viu a minissérie Little Birds a descreveu não como uma adaptação da obra de Anaïs Nin, mas como um sonho tido após ler o livro, segundo a produtora Ruth McCance. Faz sentido. Pequenos Pássaros, como foi lançado no Brasil, é uma coleção de 13 pequenas histórias sobre desejos e fantasias eróticas de diferentes personagens. “Não há uma narrativa única”, explicou McCance em entrevista ao Estadão. “A roteirista Sophia Al-Maria usou as ideias do original como inspiração, tentando ser fiel ao seu tom”, completou a produtora.

    Então, a série que chegou neste domingo, 14, à plataforma Starzplay, com estreias semanais de cada um dos seis episódios, é bem diferente, a começar por ter uma estrutura narrativa mais clássica, calcada no melodrama. Na Nova York de 1955, Lucy Savage (Juno Temple) vive em uma gaiola de ouro, cercada de privilégios e opressão. Ela acha que tudo vai ser diferente ao se mudar para Tânger, no Marrocos, para se casar com Hugo Cavendish-Smyth (Hugh Skinner), um lorde sem posses. Mas Hugo é gay e vive um romance com um príncipe egípcio. Essa é a chance para Lucy se deixar levar por suas vontades. “As mulheres naquela época não podiam explorar”, disse Juno Temple. “Elas eram treinadas para serem damas e não se empolgarem com nada. Se fossem para outro lado, eram massacradas.” Não que tudo tenha mudado para as mulheres. “Eu espero que a série ajude algumas pessoas a serem mais livres sexualmente. Porque eu acho que é um direito humano explorar sua sexualidade e o que ela significa para você”, afirmou a atriz.

    A produção tem uma equipe majoritariamente feminina: as roteiristas são todas mulheres, os episódios foram dirigidos por Stacie Passon, e elas são maioria até entre os produtores. “Tivemos muito cuidado com a maneira de filmar”, disse McCance. “Queríamos fazer algo erótico, que fosse provocante em alguns momentos e por vezes incômodo, mas a ideia não era fazer pornografia nem algo excitante.” Tanto que há mais nudez sugerida do que de fato. E, quando ela acontece, tomou-se cuidado para não ser de maneira exploradora. Havia uma série de diretrizes, inclusive não dissociar personagens de seus corpos.

    Mas o erotismo é apenas um dos caminhos de autoconhecimento e liberação. “Anaïs Nin é vista como essa autora controversa, mas ela é muito mais do que somente sexo”, disse McCance. “Ela fala muito de se tornar quem você é e ser agente da sua própria vida, de como é possível mudar e se desenvolver como pessoa. E isso pode ser sexualmente, mas também politicamente, artisticamente, criativamente.” Era um tema importante quando ela escreveu suas histórias, nos anos 1940, ou na época em que a minissérie se passa, mas também hoje. “Não poderíamos prever que haveria no ar essa necessidade de mudança e de agência, de gente tentando tomar o controle das suas vidas e sentindo que há forças tentando impedi-las”, disse Ruth McCance, citando o que aconteceu nos últimos anos, com movimentos pelo meio ambiente e o Black Lives Matter. “Esses personagens acham que as coisas precisam mudar, ou eles morrerão.” Não que a série seja política, mas há uma urgência emocional, segundo a produtora.

    A outra personagem principal é Cherifa (Yumna Marwan), uma dominatrix que luta pela independência de seu povo – colônia francesa, o Marrocos conquistou sua independência em 1956. “Sendo uma mulher árabe, fiquei muito excitada de ter uma narrativa forte, sem os estereótipos que costumamos ver”, disse a atriz libanesa. “Fico feliz que haja mais interesse da indústria pela autenticidade, que, quando há uma personagem árabe, eles procurem talentos árabes. Estamos aqui. Somos muitos.”

    Cherifa é órfã, criou-se nas ruas e venceu em seus próprios termos. “Ela não está esperando ninguém dizer o que fazer”, disse Marwan. É destemida e sabe jogar o jogo dos colonizadores para conseguir o que quer. A atriz ficou feliz de poder falar do colonialismo, uma ferida que nunca cicatriza. “Um francês me disse que eles não falam muito sobre sua história como colonizadores. Mas nós, colonizados, seja no Líbano, no Marrocos ou na Argélia, vivemos ainda as consequências disso, porque é muito recente.”

    Apesar de serem muito diferentes, Cherifa e Lucy acabam se encontrando. “Eu acho muito bacana ter duas personagens femininas que se complementam e se apoiam”, disse Juno Temple. Suas narrativas vão completamente contra o clichê de mulheres em competição. “É uma pena que ainda seja tão comum na televisão e no cinema, porque no meu dia a dia eu fico boquiaberta com as mulheres”, disse a atriz inglesa. “É importante lembrá-las do quanto são extraordinárias.”

    As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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