• Carnaval em crônica

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  • 30/01/2018 12:00

    O carnaval uma vez mais está chegando. Falo da festividade anual que descontrai o enrugado cenho, fazendo brotar a alegria, no vale-tudo em benefício do desafogo dos traumas e das paixões desesperantes.

    Para cada indivíduo, a folia tem significado : é momento de esquecer o ano que passou com todas as suas desventuras, aventuras, conquistas, derrotas ; como também é o fugaz instante lúdico para transmudar-se em outra criatura, seja pela fantasia que veste, seja pelo comportamento descontraido no meio do bloco ou espremido no salão repleto dos suores da folia.

    Sempre aparecem as mães caprichando nas fantasias que confecionam, ou compram nas lojas especializadas, transferindo para seus pequenos e encantadores seres o colorido que tiveram na infância ou que a elas foi negado pelas agruras do viver complicado de tempos dificeis.

    Nas ruas, saem blocos ruidosos em mistura representativa da real definição de democracia, onde mulheres, homens, crianças, no balanço dos simulacros de bandas e baterias, pulam, cantam, remelexem-se em contorcionismos até desconhecidos pela maioria e cujos reflexos aparecem doloridos nos dias seguintes a partir da quarta-feira de cinzas.

    Nos grandes centros desfilam as monumentais escolas de samba, riqueza de papel, cola, madeira, sucata, materiais que ganham esplendor e vida graças a talentosos e hábeis artistas anônimos, verdadeiros autores dessa manifestação da criatividade humana de vida tão efêmera quanto enriquecedora de nossa civilização brasileira.

    Barracas, quiosques, ambulantes, lojas especializadas enfeitadas, o colorido toma conta de tudo, sons ganham as ruas, as casas se iluminam pela euforia que, contagiante, faz os mais sisudos indivíduos tamborilarem ritmos nas cantos das mesas e até em paredes ocas habitadas pelos cupins.

    O carnaval contagia a pureza dos corações, faz acender paixões insuspeitadas, é momento longo de quebra de preconceitos porque a descontração é o principal motivador das ações, às vezes ultrapassando as barreiras do trivial da vida de cada ser humano.

    A melhor definição que encontrei na trilha de tantos carnavais que assisti, sobre os três dias de folia e que, hoje, são mais de quatro, o que justifica as fantasias de mosqueteiros do rei, está contida na singeleleza e na poesia do samba antigo, que ouvi em minha infância e que ainda hoje reaparece na lembrança e até interpretada por Regionais compostos de velhas guardas do samba, e que narra a odisseia de uma família simples que vê o patriarca sumir no engolfar da festa. Não sei o nome do sambista autor de tal pérola de nossa música carnavalesca – deveria sabê-lo para melhor honrar a sua memória – mas tentando repetir a letra, que minha memória cansada insiste em cantar e declamar, rendo meu tributo ao grande talento.

    Recordem comigo! Cantem comigo!

    “Vovô não gostava de carnaval / e quando ouvia um samba / até passava mal / porém um dia / não sei o que aconteceu / vovô saiu de casa / e desapareceu … / Só voltou na quarta-feira / de madrugada / cantando alegre / uma batucada!

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