• A solidão do Calvário

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  • 08/04/2018 12:00

    Só. A dor não compartilhada. O Amor perdoa, não somente sete vezes, mas setenta e sete. A misericórdia abre portas para a reconciliação. Após conhecer a ingratidão, é difícil não guardar mágoas. A traição, as injustiças estão entre as ações distantes do Amor que se manifesta na caridade. Olhar para o Sem Pecado Crucificado consiste em deparar-se com a ingratidão do ser humano. Porém, mesmo Crucificado, perdoou e amou quem O colocou na cruz. Essa é a maior resposta dada à violência. 

    Neste período de aflições, em que o país se encontra imerso na violência, atolado no lamaçal da corrupção, poluído por “fake News”, vejo a Verdade no Calvário. E, às vezes, para não perder a esperança, buscamos forças nas utopias. Há milênios, não sabemos o que fazemos…

    Se não acreditasse nos homens de boa vontade, se não tivesse exemplos como Francisco de Assis, Madre Teresa de Calcutá, Luther King, Gandhi, Padre Quinha, Papa Francisco, talvez já estivesse no pelotão dos autoexecutados como descrevera Maiakóvski em “A Sierguei Iessiênin”. Ele que afirmara no citado poema: “nesta vida, / morrer não é difícil. / O difícil/ é a vida e seu ofício”. 

    A cada dia, torna-se mais difícil carregar a rotina entre balas perdidas, sob as ameaças de aumento de impostos, sem hospital onde possa cair ferido, sem escola, para entender essa linguagem babélica. O Calvário é aqui. Cristo também está debaixo das marquises sem carteira assinada. Foi Ele mesmo quem disse, onde é possível encontrá-Lo:

    “‘Vinde, abençoados por meu Pai! Tomai posse do Reino preparado para vós desde a criação do mundo. Porque tive fome e me deste de comer, tive sede e me destes de beber, fui peregrino e me acolhestes, estive nu e me vestistes, enfermo e me visitastes, estava na cadeia e viestes ver-me.’ E os justos perguntarão: ‘Senhor, quando foi que te vimos com fome e te alimentamos, com sede e te demos de beber? Quando foi que te vimos peregrino e te acolhemos, nu e te vestimos? Quando te vimos enfermo ou na cadeia e te fomos visitar? E o rei dirá; ‘Eu vos garanto: todas as vezes que fizestes isso a um desses meus irmãos menores, a mim o fizestes’”.

    Diante desses versículos, é fácil concluir que a páscoa ocorre todos os dias. A crucificação é mantida pelas nossas atitudes. E o mais triste é ver a exploração da fé, a religiosidade tratada como empreendimento comercial. Os Judas ainda estão com seus sacos de moedas nas mãos. A traição é constante, materializada no charlatanismo. A coroa de espinho não difere muito do trabalho escravo.

    Mas há esperança, existem Cireneus, Josés, Marias, Madalenas, Pedros, Tiagos, Paulos e outros que sentem o sabor da solidão pelo compromisso com a Verdade, com a Vida. E seguem por este Caminho, sem atalhos, alimentados pela fé. Contudo, inquestionavelmente, existem momentos em que pronunciamos “meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” Porém, com a certeza da infinita misericórdia divina, é possível também dizer: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”. Essa certeza, é preciso tê-la, porque é a vertente da Luz que não se apaga.

    Caro Maiakovski, não se morre de tédio nem de vodka, quando se tem a convicção do ideal de servir ao próximo como Cristo nos ensinou, porque o Amor nos faz suportar as pedras do caminho. Obrigado pelos seus poemas. A Poesia é companheira na solidão. A sua eternidade como de outros poetas, Pessoa, Neruda, Lorca, Cecília, Drummond são ombros que ajudam a carregar a nossa cruz.  Os donos das cóleras e das coleiras não vencerão o Amor.

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